Crítica | Mãe!

Mãe! (Mother!, 2017); Direção: Darren Aronofsky; Roteiro: Darren Aronofsky; Elenco: Jennifer Lawrence, Javier Bardem, Ed Harris, Michelle Pfeiffer, Kristen Wiig, Domhnall Gleeson, Brian Gleeson; Duração: 121 minutos; Gênero: Drama, Suspense; Produção: Darren Aronofsky, Scott Franklin, Ari Handel; Distribuição: Paramount Pictures; País de Origem: Estados Unidos; Estreia no Brasil: 21 de Setembro de 2017;
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Desde o anúncio de Mãe!, o novo longa-metragem do diretor Darren Aronofsky (Cisne Negro, Noé, Fonte da Vida), criou-se uma grande expectativa entorno do projeto, tendo um elenco composto por nomes desde o da popular Jennifer Lawrence a da veterana Michelle Pfeiffer – retornando aos projetos depois de hiato de quase cinco anos. O hype só foi aumentando após o início dos materiais de divulgação totalmente visuais, mas que diziam quase nada sobre a trama.

O longa é basicamente a vida de uma mulher (Jennifer Lawrence) reconstruindo a casa de seu marido, um poeta (Javier Bardem) assolado por uma plena crise criativa. Em uma noite, um homem (Ed Harris) chega na casa pedindo abrigo, no dia seguinte sua esposa (Michelle Pfeiffer) também chega. A partir daí coisas estranhas começam a acontecer na vida daquela mulher, sobretudo na relação dela com os seus hospedes.

Todos os trailers, sinopses e materiais de promoção ao filme fizeram o máximo para esconde-lo não meramente por estratégia de marketing. É uma experiência na qual quanto menos se souber ao adentrar na sala de cinema, melhor. Inclusive, é um filme de tamanha experimentação, dum caráter tão subjetivo, que perguntas referentes ao agrado ou não do filme pós seu término são completamente superficiais, pois não é uma obra sintetizada num simples “sim ou não”, há uma série de camadas entorno da projeção, causando um misto de sentimentos, a maioria não muito agradável, contudo é difícil ter qualquer tipo de indiferença.

E o maior mérito do diretor Darren Aronofsky é justamente não causar indiferença do público à um filme tão desagradável – no mínimo – onde a passividade quase infantil de sua protagonista torna difícil uma construção de empatia mais sólida. O diretor segue uma linha bíblica ambígua, onde há uma linha meramente ténue separando punição e benção. As imagens e alegorias elaboradas por ele são esteticamente lindas, muito bem construídas, ainda que tenham um caráter duvidoso no seu significado. É fato que cada um tem uma experiência individual, com isso as alegorias devem funcionar melhor com uns do que com outros, no entanto a impressão de que aquelas imagens por mais bem feitas que sejam, são apenas isso, imagens bonitas e com significado vazio.

[A partir daqui pode haver algum spoiler que pode prejudicar a experiência de quem não viu, leia por conta e risco]

Por mais instigante que seja a narrativa, é um filme cansativo e brusco. A quebra de narrativa entre os atos é totalmente repentino, quase uma imposição de Aronofsky, aqui num auge megalomaníaco de construção de imagens e metáforas escancaradas que quase surram o espectador. Independente de gostos, é uma experiência desagradável, pesada, pautada no amplo niilismo – descrença na humanidade. Sendo o pilar disso, segundo Aronofksy, da arrogância religiosa imposta por lideranças e fiéis, em nome de um Deus totalmente ambíguo, meio sádico (por punir seus filhos) e vaidoso (os abençoando momentaneamente para ser louvado), que enxerga o mundo em constante degradação, desde os primórdios com a corrupção de Eva e sua expulsão junto de Adão do Paraíso, passando por Caim e Abel…. Até os dias de hoje, onde há guerras em nome do Senhor. Num ciclo interminável.

Muito se compara com “O Bebê de Rosemary”, de Roman Polanski, pelo caráter temático e até algumas escolhas estéticas usada por ambos – fazer o filme quase no mesmo cenário. No entanto, dá pra dizer que “Mãe!” é quase uma antítese do longa de Polanski. Em “Rosemary”, é uma narrativa entorno dos homens corrompidos, optando pelo caminho fácil que o “Diabo” oferece, num duelo maniqueísta com “Deus”. Já no filme de Darren Aronofsky, temos uma visão totalmente de desconstrução da figura de Deus, sendo este o real criador do Mal, da miséria e dos males da humanidade. Ou seja, Polanski culpa, acima de tudo, os homens pela ascensão do Mal, já Aronofsky culpa sim ao Criador.

Talvez o mais perturbador e nítido de como Deus pode ser diabólico, proposta aparente do filme, é no seu desfecho chocante, onde há uma alegoria de estupro cometido por Ele (!), algo extremamente perturbador, doloroso em níveis sádicos. É uma imagem tão forte, chega a ser questionável a sua validade na narrativa, para além do intuito de chocar. Mais que isso, esse desfecho tende a ser o tiro de misericórdia no espectador.

[Fim de qualquer spoiler]

Muitas pessoas devem ir assistir pelo fato de ser o novo filme de Jennifer Lawrence, méritos dados para atriz: ela consegue segurar com extrema maturidade uma personagem difícil – sem dúvidas o maior desafio da carreira dela. Lawrence é sufocada a todo momento, com uma câmera que só muda o foco para virar o olhar subjetivo dela. Ela tem momentos de grandeza, de expressividade, sem fazer caretas e nem caricaturas. O filme é de Jennifer Lawrence, ainda que conte com um Javier Bardem inspiradíssimo e com as boas participações de Ed Harris e Michelle Pfeiffer (esperamos que ela não entre em hiato novamente).

Reitero: Não se trata de uma experiência fácil, na verdade é bem provável ser uma das experiências cinematográficas mais difíceis do ano. No entanto, vale a pena conferir nem que seja pelo caráter de experimentação, pois rende momentos memoráveis e de profunda confrontação, interna e externa. “Mãe!” pode não ser o melhor filme do ano –e nem o melhor do diretor – porém é uma tremenda quebra de paradigma nesse tipo de narrativa.

Enfim, é um filme totalmente subjetivo, fica difícil ficar em cima do muro, mesmo quem valorize as qualidades estéticas e anule a mensagem das imagens. Após o final da sessão parece que o fim do mundo parece não só ser um alento para humanidade, como também uma necessidade, diante desse mundo tão decadente.

Mãe! – Trailer Legendado:

Crítica | Mãe!

Mãe! (Mother!, 2017); Direção: Darren Aronofsky; Roteiro: Darren Aronofsky; Elenco: Jennifer Lawrence, Javier Bardem, Ed Harris, Michelle Pfeiffer, Kristen Wiig, Domhnall Gleeson, Brian

Direção
Roteiro
Elenco
Fotografia
Trilha Sonora
Summary
64 %
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