Cobertura 41ª Mostra SP | Praça Paris

Vencedor do prêmio de melhor direção para Lucia Murat no Festival do Rio, “Praça Paris” é um filme que flertava com o desastre ao deparar duas visões completamente opostas numa obra onde o espectador se vê dividido a escolher uma delas. Tal prêmio não foi por acaso, pois é com grande propriedade que a diretora consegue levar com solidez essas duas vertentes, nos entregando um longa humano, incômodo e eficiente sobre tantos aspectos sociais, onde o povo brasileiro é o real protagonista dessa estória antropológica.

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O longa trata sobre uma ascensorista negra chamada Glória (Grace Passô) da Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ) que entra num programa de terapias, sendo tratada por uma portuguesa branca. Glória mora no morro da providência, que passa por um grande conflito decorrente da política de pacificação adotada pelo então governo local, seu irmão é atualmente um detento, porém nos desdobramentos do filme, vamos compreendendo a real situação dessa mulher e nos colocando cada vez mais numa situação de desconforto, sobretudo ao nos depararmos com pré-conceitos e embaraços nos quais, inevitavelmente, uma plateia de pessoas brancas vai se identificar (e possivelmente não gostar de se enxergar assim).

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A forma como Lucia Murat aborda o racismo, fugindo de maniqueísmos, opiniões ideológicas ou mesmo discurso panfletário, é de uma propriedade inegável. Ela sabe justamente aonde quer chegar, diante disso causa imenso desconforto, choque e até irritação do público, construindo duas personagens antíteses, porém complementares. Glória precisa se libertar dos seus traumas, que a impedem de construir uma vida verdadeira, e sua terapeuta precisa lidar com seus próprios preconceitos, limitações que a impedem de ser uma melhor profissional e pessoa. Nesse choque de duas visões, fica o espectador que percebe o quanto de hipocrisia reina na sociedade brasileira, seja por coisas básicas ou mesmo por questões de maior grandeza, como a política de “pacificação” adotada pelo governo do PMDB no Rio de Janeiro, que só serviu para militarizar as favelas e impor um Estado de medo e ineficiência para os moradores das comunidades do Estado.

Com uma atuação simplesmente soberba, Grace Passô, uma atriz mais conhecida no teatro, rouba o filme para si e o transforma de estudo de personagem para um tremendo estudo social sobre brasilidade. Se há um filme que diz muito sobre o Brasil esse ano, sem dúvidas é Praça Paris.

TRAILER

 

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