Pobres Criaturas” (“Poor Things”, 2023); Direção: Yorgos Lanthimos; Roteiro: Tony McNamara; Elenco: Emma Stone, Mark Ruffalo, Willem Dafoe, Ramy Youssef, Christopher Abbott Jerrod Carmichael, Hanna Schygulla; Duração: 141 minutos; Gênero: Comédia, Drama, Fantasia, Ficção Científica; Produção: Ed Guiney, Andrew Lowe, Yorgos Lanthimos, Emma Stone; País: Estados Unidos, Irlanda, Reino Unido; Distribuição: 20 Century Studios; Estreia no Brasil: 01 de Fevereiro de 2024;

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(Divulgação: 20th Century Studios/Searchlight Pictures)

O cinema do grego Yorgos Lanthimos tem suas peculiaridades e particularidades que o tornaram uma figura cult aclamada, sendo que o cineasta ganhou notoriedade após “Dente Canino” receber a indicação ao Oscar de Melhor Filme em Língua Estrangeira pela Grécia, em 2011. Após mais um filme em seu país de origem (“Alpes”), Lanthimos migrou para o cinema hollywoodiano e se tornou um magneto de estrelas, atraindo diversos grandes nomes para suas produções. “O Lagosta” recebeu tímido reconhecimento, provando que Lanthimos ainda era um artista de nicho, já “O Sacrifício do Cervo Sagrado” passou quase desapercebido pelos radares de premiações, enquanto a crítica, eu incluso, não se mostrou lá muito fã do filme num todo. Tudo se alinhou, no entanto, em “A Favorita”, criticamente aclamado e premiado, sucesso de público e não à toa, afinal é realmente seu filme de maior mérito como cineasta/artista. Segue sendo assim justamente porque “Pobres Criaturas”, em que Lanthimos repete a parceria com Emma Stone (“La La Land”), parece ignorar o que deu tão certo em seu filme anterior, e retornam seus vícios criativos que vão agradar com uma estética que se faz plasticamente atraente, mas deixa a desejar em outros quesitos, isso quando não decepciona por uma série de decisões de mau gosto.

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(Divulgação: 20th Century Studios/Searchlight Pictures)

Do ponto de vista técnico, “Pobres Criaturas” têm diversos méritos, mas até estes se perdem ao decorrer do filme. O universo adaptado no roteiro de Tony McNamara ganha vida através de uma visão singular de Yorgos Lanthimos, num mundo que mescla a estética da era vitoriana com um ideal steampunk, retratado pela direção de fotografia de Robbie Ryan com várias técnicas que tendem a ressaltar esse mundo que é, simultaneamente, bizarro e fascinante. É uma mescla semelhante ao tom do filme que, em meio a sua estranheza toda, equilibra muito bem um tom de seriedade e uma comicidade que ajudam a tornar o filme contundente e palatável. A trilha sonora de Jerskin Fendrix só ressalta toda essa miríade de características que ornam para tornar o que é “Pobres Criaturas” em algo funcional, quando possível. Plasticamente, o filme a princípio recria cenários da Europa com uma grandiloquência que são muito atrativas aos olhos, mas aos poucos se desgastam, pois o mais interessante se faz nos pormenores. Um reflexo quase direto disso, por exemplo, vemos narrativamente no personagem de Mark Ruffalo, que se apresenta a princípio como uma anedota, mas se estende tão mais que o necessário que acaba por se tornar uma cansativa caricatura.

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(Divulgação: 20th Century Studios/Searchlight Pictures)

E “Pobres Criaturas” se torna uma caricatura de si próprio quando se enrola em suas próprias ideias, que não consegue explorar de maneira ideal, a principal delas sendo a “liberdade” que a personagem de Emma Stone, Bella Baxter, busca atingir. Partindo de um arquétipo completamente mergulhado no conceito de “Born Sexy Yesterday”, reforçado por um elemento de escolha narrativa no mínimo questionável, seu desenvolvimento é envolto em tal male gaze que é tão absorto em si próprio que se vê incapaz de desconstruir tal conceito. Ainda que queira não parecer como tal, seu cinismo é tanto que “Pobres Criaturas” torna sua protagonista e seu arco em algo praticamente maniqueísta, e a ineficácia se ressalta nos personagens de Ramy Youssef e Christopher Abbott, o primeiro, supostamente o coração bondoso do filme, insosso e apático que só; o segundo, o ápice desse maniqueísmo e como se fosse um lembrete do que há de pior no cinema de Lanthimos: o choque pelo choque, no qual o cineasta parece se tornar o autor da crueldade insensata que a narrativa do filme debate brevemente em seu decorrer. O grande arco de “Pobres Criaturas”, portanto, recaí sobre o personagem de Willem Dafoe (“Asteroid City”), ali, sim, vemos um desenvolvimento que tem toda uma série de questionamentos que reflete o que o filme timidamente aborda através de Bella Baxter. Só que Lanthimos tem um apreço maior pelo mirabolante, numa leviandade similar a de um adolescente com hormônios à flor da pele, quando é justamente a sutileza, numa trama secundária de um homem literalmente com complexo de Deus, desconstruído (ou destruído) pelas mãos de um homem, o mais efetivo de seu filme.

Pobres Criaturas” – Trailer Legendado:

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