Mr. Robot
(USA Network, 2015-)
Direção: Sam Esmail
Roteiro: Sam Esmail, Kyle Bradstreet, Adam Penn, Courtney Looney, Lucy Teitler, Kor Adana, Randolph Leon
Elenco: Rami Malek, Carly Chaikin, Portia Doubleday, Christian Slater, Grace Gummer, Stephanie Corneliussen, Martin Wallström, Michael Cristofer, Sunita Mani, Azhar Khan, Michael Drayer, Vaishnavi Sharma, Michel Gill, Joey Bada$$, Craig Robinson, Michael Maize, Sandrine Holt
Número de Episódios: 12 episódios
Período de Exibição: 13 de Julho a 21 de Setembro de 2016
O texto contém spoilers.
O poder que Mr. Robot tem sobre seu público parece sintetizar o que se fala quando nos referimos a este período atual como uma nova era de ouro da televisão, mesmo com esta não sendo a melhor série em exibição no momento. A comoção em torno da criação de Sam Esmail se dá pela maneira como ele quebra regras e estabelece suas próprias, como muda as condições e deixa dúvidas sem medo das reações, tudo aliado a uma fotografia que também chacoalha os padrões cotidianos. Não que isso já não tenha sido feito antes, mas aqui parece haver uma paixão dos realizadores semelhante a paixão do seu público pelo que consome.
Por isso, mesmo que começando aparentemente fora da ordem do que esperávamos, Mr. Robot corresponde às expectativas após o final do primeiro ano. Agora muito mais monopolizada por Sam Esmail, que dirige todos os episódios e só não é creditado como roteirista por um quarto da temporada, adentramos justamente na mente de Elliot Alderson (Rami Malek). Mas não é uma simples escolha feita ao acaso, afinal, nem é algo que percebemos logo de início, questionamos, é verdade, mas é uma atitude que devemos ter, ao contrário de aguardarmos acomodados por alguma resolução, se é que há alguma.
A intercalação entre os personagens, ligeiramente tirando o protagonismo de Elliot do panorama completo, colabora com a complexidade da percepção, ainda assim, de forma alguma atrapalha o trajeto pelo qual acompanhamos o personagem de Rami Malek. É verdade que é necessário um pouco de boa vontade para aceitar a revelação do que estávamos acompanhando no ponto de vista de Elliot, cuja realidade só é entregue por completo no nono episódio, quando as peças do tabuleiro parecem finalmente ter todas se alinhado nas posições que precisavam estar. O que, de certa forma, enfraquece um pouco do que víamos na mente de Elliot, mas não se torna menos interessante ou competente.
Até porque, enquanto mergulhado no seu padronizado subconsciente, Elliot dá espaço para que Mr. Robot explore algo do qual se vangloria, e não à toa: suas personagens femininas. O protagonismo da série realmente passa a tender às mulheres da trama, em quatro diferentes frentes, mas com um paralelismo que só se torna mais interessante e intrigante quando, por fim, os caminhos delas se cruzam. O que, em parte, demonstra como Mr. Robot sabe lidar com essas linhas paralelas com maestria, afinal uma dessas conexões se dá num dos melhores episódios, senão o melhor, de toda a série.
Chega a ser irônico o sexto episódio de Mr. Robot começar como uma sitcom dos anos 80/90. Mesmo que distorcida a realidade dos acontecimentos dentro da sequência, a comicidade presente ali parece não fazer frente ao que se segue no episódio. A exemplo de um plano sequência carregado de tensão, numa das melhores cenas da série, que apesar de se encerrar de maneira infeliz, do ponto de vista técnico, exerce sua função perfeitamente por aproximadamente seis minutos. Mas é na forma como o episódio se encerra que Mr. Robot demonstra todo o diferencial que possui.
É como se o episódio se iniciasse declarando que aqui trataria especificamente de emoções. Se a princípio almeja as risadas e posteriormente a ansiedade, se encerra de maneira gratificante, num misto de emoções que é agridoce, reservando tanto alegria como tristeza num dos momentos mais contundentes de Mr. Robot. Aí é que a série sustenta-se de maneira mais segura, porque não é inteligente somente em relação a tecnologia e seu uso, mas também na relação entre personagens, no núcleo dramático propriamente dito. Apesar dessa inteligência, parece quase inevitável que reserve ali, infelizmente, diversos altos e baixos.
Porque alguns acontecimentos exibiram maior efeito, seja ou em comoção ou ao simplesmente chocar o público, na primeira temporada. A exemplo da morte de Shayla (Frankie Shaw), da qual mesmo um ano depois dificilmente me esqueço da potente reação causada. Neste segundo ano Mr. Robot parece banalizar alguma dessas situações, que se dão de uma maneira mais leviana, como quando acidentalmente Darlene (Carly Chaikin) mata Susan (Sandrine Holt). Mas não é somente isso, a sensação é que algumas coisas acabam por se tornar usuais demais, mesmo que funcionem perfeitamente bem. Mas se falha um pouco no emocional, também desliza de maneira igual tecnicamente.
Por mais que a maneira como Sam Esmail opte para utilizar a fotografia de sua série fale sobre o estado de ansiedade social de Elliot, em alguns momentos seus enquadramentos mais experimentais não funcionam bem em alguns diálogos. Não é retornar para um básico plano e contra plano, isso não é necessário, mas ao longo desta segunda temporada de Mr. Robot há muitos diálogos, mesmo que não envolvendo Elliot, que desconstroem o foco de atenção dos enquadramentos. Enquanto em momentos pode ser algo intencional, em outros há somente de prejudicar a série em si, pois a atenção é desviada erroneamente dos atores para os lados vazios do quadro.
Nem por isso Mr. Robot deixa a desejar em sua qualidade, tais detalhes são mínimos empecilhos que impedem a série de atingir seu potencial máximo, e é somente isso. Não estragam a experiência quase insuperável que é acompanhar a paranoia da série criada por Sam Esmail. Que mesmo em um final de temporada que responde diversas perguntas, e encerra teorias, abre portas para muitos outros questionamentos. Dando também a oportunidade de desenvolvimento que, mais do que necessário, é muito bem-vindo quando se trata dos personagens de Stephanie Corneliussen, Grace Gummer e BD Wong. Dos três nomes, possivelmente um deles é o que dará as maiores respostas, e não acredito que será necessariamente o terceiro.
Mas talvez o maior questionamento e a resposta mais importante não estejam nos mistérios ficcionais deixados por Mr. Robot durante o desenvolvimento de sua narrativa. Talvez aquele questionamento intencionalmente direcionado ao público durante um episódio, em uma das quebras da quarta parede, seja o mais contundente da série. Se Elliot questiona o que é normal ou não, nós fazemos o mesmo, e somos questionados quanto a isso. Mas nunca respondemos. Ou talvez o silêncio seja nossa resposta, porque estamos observando atentamente o desenrolar da conexão do que tanto temos em comum com os personagens, do que tanto nos envolve em Mr. Robot. Não estamos sozinhos e estamos cientes disso agora, só resta saber, então, de que é a hora.
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