“Moonage Daydream” (2022); Direção: Brett Morgen; Roteiro: Brett Morgen; Elenco: –; Duração: 140 minutos; Gênero: Documentário; Produção: Brett Morgen; País: Alemanha, Estados Unidos; Distribuição: Universal Pictures; Estreia no Brasil: 15 de Setembro de 2022;
David Bowie dispensa apresentações, pois até mesmo as gerações mais novas consomem, com toda certeza, produções de todo o tipo que ainda contam com forte influência do que o artista fez em vida, e em formatos que transcendem a música, algo cuja escopo é certamente imensurável. Quem sabe agora ganhe uma nova relevância e evidência, angariando ainda mais fãs e apreciadores. Porém, mesmo seus mais ávidos fãs talvez não conheçam tanto suas diversas facetas ao longo da vida como podemos vislumbrar em “Moonage Daydream”, um material que se faz histórico com méritos. A intimidade do documentário de Brett Morgen é especial, algo que só é possível por se tratar do acesso dado ao cineasta à materiais dos arquivos pessoais de Bowie, cerca de 5 milhões de ativos, desde desenhos e gravações à raros diários, uma miríade de artefatos os quais Morgen utiliza com maestria para construir o que vemos. E essa construção é o que vai permitir com que “Moonage Daydream” se torne mais que apenas uma colagem de imagens de uma figura icônica e lendária, o trabalho de Morgen tenta ir de encontro a todo o brilhantismo de seu protagonista, um feito que parece impossível, é verdade, mas o resultado faz, sim, jus ao que David Bowie foi e nos deixou.
O principal quesito para os trunfos de “Moonage Daydream” é a sua montagem, também assinada pelo próprio Brett Morgen. É um trabalho muito meticuloso, feito com todo o respeito possível, e isso é tudo perceptível, assim como o fato de que Morgen precisa ir ao encontro de Bowie, porque sua visão simplesmente não é o suficiente para contemplar tudo aquilo que está ali, e não é nenhum demérito em reconhecer isso. Se David Bowie relata que precisava se desafiar para criar novas composições, e que não podia, de alguma forma, se sentir confortável, Brett Morgen precisa fazer o mesmo para encontrar um rumo para essas imagens, e seu trabalho é impecável. A forma como ele dá vida ao filme torna “Moonage Daydream” numa viagem psicodélica, cuja experimentação ecoa com o que as imagens pessoais de Bowie resguardam. Mas há algo há mais ali, e é ao encontrar sentido nisso tudo que Morgen dá um passo além. É absurda a beleza que encontramos na estruturação desse mito, o encantamento que a razão da montagem dá a uma vida vívida ao seu máximo. Tecnicamente é um filme bárbaro, ainda mais em como utiliza as músicas de Bowie e num trabalho de edição e mixagem de sons digno das melhores salas de cinema! Um casamento perfeito.
Por fim, não é nem que Morgen tente humanizar de maneira dramática, ou sequer entender em completa devassa quem foi David Bowie, mas “Moonage Daydream” trabalha algumas reflexões muito pessoais de seu protagonista e nos aproxima ainda mais dele. É também um processo de conhecimento, não apenas do outro. É uma experiência cinematográfica que aguça os sentidos e os sentimentos, pede para que se reflita sobre o mito, Bowie, e si próprio, o espectador. Não é à toa que o filme abra com uma citação de Bowie sobre Nitzsche, porque isso é parte fundamental de “Moonage Daydream”. Porém, há um certo didatismo na maneira com a qual o filme é estruturado, então torna tudo um pouco mais simples de consumir, deixando claro a passagem de tempo das diferentes fases da vida de David Bowie, mas à sua própria maneira. No fim você se sente elevado, como se contemplasse algo divino. É um reconhecimento da qualidade do trabalho de Brett Morgen em contar uma história através da história, mas da maneira necessária para nos reencontramos com Bowie.