Alice Júnior (2019); Direção: Gil Baroni; Roteiro: Luiz Bertazzo, Adriel Nizer Silva; Elenco: Anne Celestino Mota, Emmanuel Rosset, Thais Schier, Surya Amitrano, Matheus Moura; Duração: 86 minutos; Gênero: Comédia; Produção: Andréa Tomeleri, Gil Baroni; País: Brasil; Distribuição: Olhar Distribuição; Estreia no Brasil: –;
A questão de representatividade anda em voga nos debates mundiais. Já não é mais aceitável um intérprete cis desempenhar um papel de personagem transsexual. A televisão nacional anda alinhada a esse discurso, nos últimos tempos vem escalando e dando visibilidade para diferentes grupos LGBTIS aos quais sempre retratou de forma cômica e/ou superficial. Sintonizado com essa leva, o filme “Alice Júnior“, do diretor Gil Barone, dá voz a uma menina trans, a tal Alice Jr do título (Anne Celestino), ela mora em Recife com seu pai Jean (Emmanuel Rosset). Contudo, quando seu pai precisa se mudar decorrente do trabalho, a menina tem seu mundo virado ao avesso, indo morar no Paraná, tendo que enfrentar as mudanças regionais: a cultura, sociedade, clima, além do próprio fardo de construir sua rotina, amizades e ofícios em um ambiente aparentemente hostil.
As boas intenções do longa flertam com uma estética um tanto cafona, a proposta tão arrojada da obra de Barone, justamente de dialogar com a contemporaneidade se contrapõe ao microuniverso narrativo construído a base de clichês comuns: A escola religiosa comandada por uma diretora tirana, os bullyings habituais, o triângulo amoroso… Enfim, são caminhos tão comuns, aos quais a originalidade se mostra presente apenas em seu desfecho, transformando a obra em questão num road movie de Alice entorno dela se encontrar e aceitar a si mesma (seus desejos, anseios, planos etc). Apesar de escolhas questionáveis do roteiro, um tanto conveniente, a opção em mostrar um pai solteiro, extremamente parceiro de sua filha e sequer dar explicações sobre o processo de transição da mesma, soa assertivo e rende momentos genuinamente ternos. Se tratando das figuras paternas construídas entorno da narrativa audiovisual brasileira, o que os roteiristas Luiz Bertazzo e Adriel Nizer Silva fazem é quase uma desconstrução dessa figura, propondo uma nova leitura.
O destaque total fica para Anne Celestino, uma atriz expressiva, carismática e encantadora. Consigo imaginar que esta tem futuro no audiovisual, espero que seja descoberta e não fique refém apenas do mesmo tipo de personagem. Aparenta ter muito a oferecer. “Alice Júnior” está bem longe de ser um filme perfeito, contudo, é bastante confortável e agradável, soa um alento aos tempos atuais, deixando uma sensação de esperança, tanto nas pessoas quanto no cinema nacional.
Acompanhe aqui nossa cobertura da 43ª Mostra Internacional de Cinema de São Paulo.