The Leftovers (3ª Temporada) (HBO, 2014-2017); Criada por: Damon Lindelof & Tom Perrotta; Direção: Mimi Leder, Keith Gordon, Daniel Sackheim, Nicole Kassell, Carl Franklin, Craig Zobel; Roteiro: Damon Lindelof, Tom Perrotta, Patrick Somerville, Tom Spezialy, Tamara P. Carter, Haley Harris, Lila Byock, Carly Wray, Nick Cuse; Elenco: Justin Theroux, Carrie Coon, Christopher Eccleston, Amy Brenneman, Scott Glenn, Kevin Carroll, Bill Camp, Jovan Adepo, Lindsay Duncan, Damien Garvey, Chris Zylka, Margaret Qualley, Ann Dowd, Janel Moloney, Regina King, Liv Tyler; Número de Episódios: 08 episódios; Data de Exibição: 16 de Abril a 04 de Junho de 2017;
The Leftovers se encerra naquela que é sua melhor temporada. Não só porque os criadores Damon Lindelof e Tom Perrotta, assim como o elenco, os outros produtores, diretores e roteiristas, ou toda a equipe da série, colocaram seu melhor à prova, mas por colocarem em uso a favor daquilo que se tornou a série da HBO. Por méritos próprios a produção passou a ser cultuada com justiça, e a paixão pelo que se viu era tanta que é difícil ter de dizer adeus. Partidas, porém, são inevitáveis. A conclusão chega dois anos após a série, na opinião de muitos, ter se consagrado como a melhor da atualidade. Corresponder às expectativas podia ser algo traiçoeiro a se tentar, por isso mesmo The Leftovers parece olhar a si mesma, optando por trilhar com segurança sobre o que tinha certeza em relação ao que até então havia feito. O excesso de confiança se faz uma bem-vinda adição, numa toada com um quê experimental em determinados momentos, mais especificamente nas diferentes aberturas utilizadas ao longo da temporada. Elemento este que servia de indicativo não só pelo porvir de cada episódio, mas do pleno encontro de The Leftovers com sua essência, como um aviso de que o auge da série, e talvez até da era em que se encontra a televisão, estava logo ali.
Se pode escolher crer que é um exagero elevar a série a tal patamar, contudo, ela o faz por si só e resta a nós acompanhar, embasbacados ou não. O ato de contar histórias encontra na narrativa desta temporada, porém, um encaixe que raramente se vislumbra. O amor por tal ato, bem como a aptidão para tal, sintetiza a grandeza em The Leftovers toda vez que um personagem para em frente a câmera e relata uma história, relata sua própria narrativa. Os elementos externos destas histórias se fazem um só com tudo que vemos em cena, gerando uma riqueza contextual que funciona em diferentes níveis para com o espectador. Muito por conta daquilo que cada personagem representa de nossa realidade, para além do -óbvio- desenvolvimento satisfatório de cada um deles. Numa série que sempre funcionou com ambiguidade, a um passo do devaneio e outro da realidade, atenuam-se os limites quando essas vertentes, que tais personagens representam, passam a se encontrar nessa mesma situação de ambiguidade, entrando em um estado de choque com si próprios. Ceticismo e misticismo se confrontam, então, quando Nora Durst (Carrie Coon) os torna uma mesma parte da verdade, culminando em um ápice no qual The Leftovers nos responde com o mais satisfatório dos questionamentos.
Quando chegamos ao finalmente, muito se encerra sem uma afirmação conclusiva, mas é diferente de dizer que não houveram respostas. Teorias estão aí para alimentar os fãs de The Leftovers até o fim dos dias, no entanto não é o que realmente interessa, teorizar sobre o que haveria ou não ocorrido, principalmente com Nora. Os momentos finais da série, com um Kevin (Justin Theroux) indubitável sobre os relatos de sua amada, resumem o que até então assistimos. Há toda uma possibilidade, bem como também só pode haver uma realidade, mas em qual acreditar é uma satisfação que cabe a cada espectador. O que é imutável reside nessa singularidade criada entorno dos personagens, no nível dramático que se atingiu e estabeleceu ao longo das três temporadas. Permitindo, portanto, uma reta final que dedica devida atenção a estas figuras que transcendem o pouco que inicialmente as delineava, trazendo à vida uma cadeia de emoções que é resultante destas provações às quais são submetidos tanto personagens como público. É quando se deixa de lado qualquer maniqueísmo, algo que parece inexistir na série, e entram os multifacetados personagens que compreendemos numa plenitude reveladora, que individualmente são desenvolvidos em tramas que exacerbam o posto de apenas coadjuvantes, tornando-se protagonistas para além de seus próprios episódios.
Todos são propulsionados pela promessa de algo que parece inevitável. O aniversário que se dizia o definitivo da Partida Repentina, quer acredite nas suposições ou não, mexe de alguma maneira com estes personagens. Mas a maneira como os vemos sendo sensibilizados por isso manifesta-se de tantas formas e, ainda assim, todas elas parecem se reduzir a alguém que já não se fazia mais presente. O retorno de Ann Dowd (Capitão Fantástico) como Patti Levin em único episódio, este que repete acertadamente uma fórmula e assim como International Assassin conta com execução estupenda, culmina em um acontecimento que corresponde ao lado interno do questionamento. Enquanto a história de Nora, sobre sua jornada e os que partiram, remete ao público para que faça um voto de confiança no que acredita, dando uma saída tangível; a história de Kevin, controlada por Patti, diz respeito ao escopo intangível, abordando essa estrutura emocional que permeia e potencializa The Leftovers. O que fica explícito naquela realidade findada em um apocalipse nuclear, porém, é algo que a personagem já havia dito na primeira temporada, ao declamar o poema de W.B. Yeats. A expectativa que toma proporções nas quais um vindouro acontecimento se faz uma necessidade; um reflexo da futilidade dos desejos e anseios intermináveis, mesmo quando tudo que é preciso já se encontra ali.
The Leftovers se alinhava, portanto, a um final que guardava uma reunião completa e liberta de expectativas, composta de dois remanescentes vítimas de inúmeros traumas, decepções, depressões, perdas e provações. A mais valente garota na Terra e o mais poderoso homem no mundo, os dois que ali restaram. É bonito como o último episódio, numa direção brilhante de Mimi Leder, se doa a ambos os personagens. É verdade que mais a Nora do que Kevin, entretanto nada mais justo, quando este último já havia tido para si o episódio anterior. O protagonismo da personagem corresponde ao quanto ela e sua própria intérprete cresceram ao longo da série. Carrie Coon então coroa The Leftovers com um trabalho irretocável, assim como a série providência a ela uma reciprocidade. Com isso, tanto no penúltimo como no último episódio, um círculo se encerra com perfeição, em detalhes que vão dos mais evidentes, como um rolo de papel toalha sobre a mesa, como dos mais sutis, quando trechos de diálogos parecem remeter ao poema “A child said, What is the grass?”, de Walt Whitman. O texto que servia de base como narração a um dos primeiros promos de The Leftovers e que me convenceu a assistir a série. Quatro anos depois The Leftovers obviamente se expande para além disso, e até das melhores de minhas expectativas, numa conclusão que é aquilo que a série sempre foi. Tom Perrotta e Damon Lindelof criaram um reflexo da atemporalidade de ser. Estar. Existir.
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