Narcos (2ª temporada)
(Netflix, 2015-)
Direção: Andrés Baiz, Josef Kubota Wladyka, Gerardo Naranjo
Roteiro: Adam Fierro, Zachary Reiter, Steve Lightfoot, Carlo Bernard, Doug Miro, T.J. Brady, Rasheed Newson, Julie Siege, Gideon Yago, Curtis Gwinn, Clayton Trussell
Elenco: Wagner Moura, Pedro Pascal, Boyd Holbrook, Diego Cataño, Paulina Gaitan, Paulina García, Leynar Gomez, Joanna Christie, Maurice Compte, Stephanie Sigman, Juan Pablo Raba, Eric Lange, Bruno Bichir, Alberto Ammann, Juan Sebastián Calero, Martina García, Cristina Umaña, Jon-Michael Ecker
Número de Episódios: 10 episódios
Data de Lançamento: 02 de Setembro de 2016
O texto contém spoilers.
Um dos momentos chave de Narcos, em todos os quesitos, surge no penúltimo episódio dessa segunda temporada, quando o Pablo Escobar de Wagner Moura, pela primeira vez em anos, visita seu pai. Todo o episódio funciona como uma catarse para o inevitável, que sabemos estar preste a acontecer no final da temporada. Mas em todo o tempo que Pablo passa ali, não à toa o momento mais memorável é uma discussão que Pablo e seu pai tem, após este banhar o filho em sangue de porco. Pablo, tanto literal como figuradamente, tem sangue em suas mãos, contudo, as palavras que profere ao seu pai parecem resumir a personalidade da controversa figura que foi o traficante.
Este segundo ano da série se inicia imediatamente aonde o ano de estreia de Narcos nos deixou, com Pablo Escobar escapando do cerco na prisão, numa fuga que só tal figura seria capaz de realizar. Fuga que também acarreta mudanças envolvendo aqueles que empregam a caçada pelo narcotraficante. O que torna tudo ainda mais burocrático para os agentes do DEA norte-americano, fazendo um favor a Narcos, que ganha tempo para postergar o inevitável destino de Pablo Escobar por toda uma temporada. E se no primeiro ano a série nos mostrou a escalada do personagem, esta segunda temporada se estende para mostrar sua queda em desgraça.
No entanto, nada disso dá indicativos de que Narcos consertará os deslizes que cometeu em sua temporada de estreia, pelo contrário, a série inclusive faz um esforço para se adequar a determinados aspectos que se faziam destoantes. O tom documental está mais dissolvido do que nunca e, ainda que não assuma essa faceta como a principal, ela exerce forte presença na série. O que não é algo positivo e chega a ser tão ilusivo que há ainda a patética insistência de inserir, previamente a cada episódio, uma cartela falando que se trata de uma obra ficcional, como se as mentes por trás da série fossem senhores de uma verdade absoluta.
O que surge, provavelmente, por conta do apego de José Padilha, agora também showrunner de Narcos, com os fatos. Não é, no entanto, na fidelidade que se recriam conhecidos ou icônicos momentos envolvendo Pablo Escobar, mas justamente quando não se faz isso, justamente quando se opta por não reconstruir o todo. Na abertura do décimo episódio, quando vemos Pablo Escobar sonhando ser o presidente da Colômbia, temos em primeiro momento algo como um insert de imagens de arquivo, dos quais Narcos tanto usa, porém, este é ficcional, nunca existiu além da imaginação do personagem vivido por Wagner Moura, mas é o único momento que o ator tem oportunidade de “recriar” algo assim.
Aí reside uma das maiores falhas da série, e que enfraquece em muitos momentos a atuação de Wagner Moura. Há momentos em que o ator exerce um trabalho brilhante, mas, em muitos outros, a transição de inserts para a ficção, não vem a calhar, rompendo o envolvimento entre público e série, porque Narcos se torna uma ficção distante demais para ser convidativa. Sem contar o didatismo que isso pressiona, aliado a narração em off de Boyd Holbrook, que se torna ainda mais formal, se apresentando de forma pontual e forçando goela abaixo informações que a série opta por não retratar.
O que só tende a se intensificar em próximas temporadas, visto que se acompanhará outro cartel, com nomes que não são assim tão conhecidos e eventos que carecem de serem difundidos. Problemas de desenvolvimento de personagens poderão se evidenciar, pois mesmo isso sendo um possível problema da eventual terceira temporada, algo já ficou bastante claro no segundo ano de Narcos, que de fato precisará se reinventar. Ainda que se queira afirmar que o título da série já o era assim por não se referir somente à vida de Pablo Escobar, sinopses e divulgação da série na temporada de estreia podem muito facilmente contrariar tal pensamento.
Escobar tanto é o protagonista de Narcos que a série precisou fatiar-se, por abranger inúmeros antigos e novos personagens, introduzindo e reintroduzindo nomes para uma futura reinvenção. O que ofuscou dois grandes nomes do elenco: o próprio narrador da história, interpretado por Boyd Holbrook, e seu parceiro, Javier Peña, interpretado por Pedro Pascal. A atenção dada ao primeiro é quase irrelevante nesta segunda temporada, desenvolvê-lo é uma questão tão nula que seus problemas com a esposa podem facilmente serem esquecidos ou perdoados para a série seguir em frente.
O Javier Peña de Pedro Pascal, apesar de receber maior atenção, carece de um melhor desenvolvimento, porque seu destaque nesta segunda temporada se dá muito mais por ter ele como uma peça convencional para os roteiristas, facilitando a construção de uma continuidade pós Pablo Escobar. O que é uma infelicidade, porque alguns dos melhores questionamentos morais de Narcos surgem nas empreitadas do personagem, mas a maneira com a qual se resolvem acaba refletindo a dubiedade da qualidade da série no geral, que deixa a desejar nos momentos que precisa se firmar com mais veemência.
Porque é tudo sobre o Pablo Escobar de Wagner Moura, que não só rouba a cena, como tem toda a temporada construída em prol disso. Obviamente por conta de seu destino fatal. Todavia, o mais surpreendente de tudo isso não está neste personagem ou no ator que o interpreta, muito menos no fiel Limón (Leynar Gomez), que lhe acompanha até o último momento. O que mais surpreende é o retorno de Juan Pablo Raba como Gustavo Gaviria, primo de Escobar. Seu retorno, tanto em flashback quanto numa alucinação de Pablo, mostra a importância conquistada pelo personagem na primeira temporada, aqui culminando em momentos emocionais singulares para a temporada.
Temporada que parece servir como um swan song de Pablo Escobar, porém, estendido mais que o necessário. Afinal, tente imaginar qual não seria o choque de se ter Escobar enfrentando um destino tal qual o que ele dá ao Coronel Carrillo (Maurice Compte)? Mas não podia ser diferente, visto que Narcos retrata Pablo Escobar como uma criança mimada, que deixou um rastro de desgraça por não ter tido o que queria. Como ele diz ao pai, o presidente dos Estados Unidos sabe quem ele é. Hoje, até o atual presidente sabe muito bem quem ele foi, mas independentemente da empatia gerada por Narcos, humanizando a figura de Pablo Escobar, a série nunca consegue estabelecer algo além disso.
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