Na próxima quarta-feira (7), começa a nona edição do Olhar de Cinema – Festival Internacional de Cinema de Curitiba.

Adaptando-se ao momento de isolamento social decorrente da pandemia de covid-19 que assola o país e o mundo, o festival terá uma edição completamente on-line, mantendo preços acessíveis -embora limitados- e horários flexíveis.

Separei aqui algumas recomendações de obras imperdíveis a serem conferidas ao longo da edição.

Destaques do 9º Olhar de Cinema:

  • “Para Onde Voam as Feiticeiras”

Novo filme de Eliane Caffé (“Os Narradores de Javé”, “Era o Hotel Cambridge“), dirigindo ao lado da irmã, Carla Caffé e de Beto Amaral. “Para Onde Voam as Feiticeiras“, que abre a nona edição do Olhar de Cinema, acompanha um grupo de performers LGBTQIA+ em intervenções artísticas no centro de São Paulo. Suas ações são disparadoras de debates sobre desigualdades sociais, preconceitos e vidas marginalizadas, permeados pelas lutas dos movimentos negro, indígena, de ocupações urbanas. Com uma forma híbrida em contínua construção, o filme aposta menos na busca por respostas e mais no diálogo coletivo enquanto método e finalidade. Ele extravasa a circunscrição de bandeiras identitárias, permitindo-se contaminar pela centelha incontrolável de vida que vem do gesto de lançar-se às ruas.

Quando: 07/10

  • Cabeça de Negô”

O universo de uma escola pública cearense é aqui examinado em sua potência de revolução social. Quando o jovem Saulo Chuvisco (interpretado por Lucas Limeira) é alvo de um insulto racista que sai impune, e recusa-se a deixar o espaço da escola em protesto, as consequências do seu ato indisciplinar afetam toda a comunidade. Com uma narrativa envolvente aliada a um questionamento de fundo sobre o poder das imagens, o filme opera uma crítica contundente às dinâmicas de discriminação racial e de classe no Brasil, apostando na tomada de consciência coletiva que leva à ação popular direta. Presente na Mostra Tiradentes 2020. Faz parte da Mostra Olhares Brasil.

Quando: 10/10 e 14/10

  • “Sertânia”

Mais de 50 anos depois de realizar alguns dos essenciais documentários acerca do cotidiano do sertão nordestino e da vida dos migrantes oriundos de lá, Geraldo Sarno retorna a esse espaço com a liberdade e clareza que apenas a maturidade permite atingir. Não é exagero dizer que “Sertânia” conversa de igual para igual com Guimarães Rosa ou Marcel Proust em seus voos (e rastejos) pela memória e pela fabulação. A história de seu protagonista costura com precisão Canudos, como nosso “pecado original”, com a vida migrante no Sudeste e o cangaço. Não é pouco. Faz parte da Mostra Olhares Brasil.

Quando: 08/10 e 12/10

  • “Luz nos Trópicos”

Em 2013, após décadas de trabalho em múltiplas linguagens, Gaitán estreava sua épica primeira ficção, “Exilados do Vulcão“. Ainda mais audacioso, seu mais recente filme navega por memórias caudalosas das Américas. Inspirado em uma expedição europeia do séc. XIX e mobilizado pela busca de Igor (interpretado por Begê Muniz) por sua ancestralidade Kuikuro no momento presente, o river movie revisita e reinventa, entre Nova Iorque e o Pantanal, imagens, parcerias e procedimentos que atravessam a obra da artista. Nesta impressionante viagem, a passagem do tempo se dilui no fascínio persistente das mais instigantes paisagens sonoras e visuais. Presente na edição de Berlim 2020. Faz parte da Mostra Competitiva.

Quando: 09/10 e 13/10

  • “Nasir”

Em meio a uma rotina dura vivida entre as jornadas para o trabalho como vendedor de tecidos e o cuidado com sua família, incluindo o filho adotivo com deficiências, Nasir não deixa de sonhar com um futuro mais confortável, enquanto escreve cartas de amor para a esposa e declama suas poesias. Só que Nasir (interpretado por Koumarane Valavane) também é um muçulmano, vivendo num país cada vez mais dominado por uma latente intolerância com suas minorias religiosas. O auto-didata Karthick filma com atenção os ritmos da vida cotidiana e a maneira insidiosa como a realidade social pode sufocar as existências humanas. Presente na competição do Festival de Rotterdam 2020. Faz parte da Mostra Competitiva.

Quando: 08/10 e 12/10

  • “Nardjes A.”

Em março de 2019, o cineasta cearense Karim Aïnouz parte em busca das raízes de sua família paterna para realizar um filme autobiográfico, indo pela primeira vez à Argélia. Chegando lá, inspirado pelo entusiasmo das manifestações contra o governo local, termina “achando” um outro filme. Como nas suas ficções, sua câmera se cola aos movimentos da sua protagonista Nardjes, uma jovem ativista, ao longo das 24 horas ao redor de uma manifestação em pleno Dia Internacional das Mulheres. Ao filmá-la com paixão, o cineasta, exilado em Berlim há alguns anos, deixa implícito um chamado aos compatriotas brasileiros Exibido na mostra Panorama, do Festival de Berlim. É um dos filmes da Mostra Exibições Especiais.

Quando: 08/10 e 12/10

  • “Letra Maiúscula”

“Queremos justiça e liberdade!”, gritava em caixa alta a inscrição em um muro de Bucareste, em 1981. A infame história do adolescente Mugur (interpretado por Bogdan Zamfir), perseguido pela ditadura de Nicolae Ceausescu, é inventivamente narrada por Radu Jude (de “A Nação Morta”, Olhar ’18) através da costura entre relatórios de segurança nacional e imagens televisivas da época. Inspirado em uma peça teatral, o filme lança mão da artificialidade do dispositivo cênico emaranhado à pesquisa de arquivo, lembrando-nos a todo momento que a História, assim como os discursos, está constantemente em disputa. Exibido no Festival de Berlim. Faz parte da Mostra Novos Olhares.

Quando: 11/10 e 15/10

  • “O Reflexo do Lago”

A usina hidrelétrica paraense de Tucuruí, uma das maiores do Brasil, carrega no seu entorno uma contradição: os habitantes das ilhas formadas por seu lago não têm acesso a direitos básicos, dentre eles a própria energia elétrica. Com um olhar sensível para o espaço, o documentário nos apresenta estes sujeitos fascinantes em uma estética p&b que atravessa os encontros, relatos e imagens de arquivo. Símbolo do ideal de progresso destrutivo do regime militar, a usina materializa o desejo de domar a floresta, enquanto essas comunidades nos ensinam outros caminhos de lida e cuidado com a terra. Presente no Festival de Berlim. Faz parte da Mostra Outros Olhares.

Quando: 11/10 e 15/10

  • “O índio Cor de Rosa Contra a Fera Invisível: A Peleja de Noel Nutels”

No momento em que uma pandemia massacra as populações indígenas do Brasil, sob o beneplácito de um governo saudoso da ditadura, parece urgente ouvir a voz do médico sanitarista Noel Nutels, que ressurge aqui em seu único registro remanescente, falando ao Congresso em pleno regime militar. Em cotejo com um material audiovisual impressionante, capturado por ele em suas missões aos territórios indígenas, essa voz não esconde a agressividade inata a seu lugar de fala. Nutels não é, aqui, o herói de um cordel laudatório: é um fantasma consciente das suas faltas que interpela o silêncio cúmplice dos que se calam. Faz parte da Mostra Outros Olhares.

Quando: 09/10 e 13/10

  • “Vento Seco”

No árido interior de Goiás, um triângulo amoroso é desencadeado pela chegada de um misterioso forasteiro, perturbando a pacata rotina de Sandro (interpretado por Leandro Faria Lelo), funcionário de uma fábrica de fertilizantes. Em seu primeiro longa de ficção depois de dois documentários e vários curtas, o goiano Nolasco continua sua exploração da geografia do cerrado e do imaginário homofetichista. Apropriando-se, ao seu modo inconfundivelmente brasileiro, de elementos camp explorados por nomes essenciais do cinema queer, ele elabora um diálogo tórrido e ousado com os códigos melodramáticos. Exibido no Festival de Berlim 2020. Faz parte da Mostra Foco.

Quando: 10/10 e 14/10

  • “Antena da Raça”

Em 1979, enquanto o Brasil vivia o momento conturbado da Lei da Anistia, Glauber Rocha realiza para a TV Tupi o programa Abertura, no qual interroga de frente um Brasil contraditório e em ebulição, pleno de utopias mas sempre sob o peso de chagas seculares. Quarenta anos depois, sua filha Paloma e o parceiro Luís Abramo voltam a esse material, recentemente restaurado, e o colocam em fricção com cenas do cinema de Glauber – mas também com imagens do Brasil de 2018: um país ainda conturbado e contraditório, que parece perseguir o rabo de sua própria história. Filme de encerramento da edição do olhar 2020.

Quando: 15/10

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