O coming of age é praticamente um gênero cinematográfico, muito em voga no cinema americano nos últimos anos, com filmes como “Lady Bird – A Hora de Voar” (2017) e o recente “Oitava Série” (2018).  O cinema nacional sempre teve certa dificuldade em abordar a temática jovem, seja pelos esteriótipos básicos na construção dos personagens ou ainda pelo fato, quase banal, de serem pessoas mais velhas – pais- retratando o que eles personificam num jovem atualmente. Parte disso se quebra em “Um Filme de Verão“, uma obra observacional de jovens periféricos no Rio de Janeiro durante suas férias de verão. O maior trunfo da diretora Jo Serfaty é fazer um longa metragem sobre jovens, com jovens e submeter sua linguagem audiovisual para esta proposta.

Karol (Karol Rabech) busca um emprego com o sonho de morar no Japão, idealizando o estilo “kpop” de ser; Caio (Caio Neves) busca encontrar um caminho espiritual que o proporcione plenitude e estabilidade; Junior (Junior Souza) precisa lidar com o fato de estar sem perspectivas no Rio de Janeiro, sendo obrigado a se mudar com sua mãe para Paraíba, deixando seu relacionamento e suas amizades; Ronaldo (Ronaldo Lessa) precisa lidar com sua sexualidade e demais anseios com seu futuro. Todos os personagens, além de serem críveis, são pessoas normais, vivem dilemas do cotidiano, aos quais muitos jovens passaram, passam e passarão. Uma grande sacada como Serfaty, ao observar com certo distanciamento seus personagens, conseguem achar grandeza na normalidade, ao contrário de seguir caminhos comuns de dramatizar conflitos, ao ponto de torna-los banais.

O longa consegue repaginar imageticamente o imaginário da juventude brasileira, atualizando para os anos atuais. Representando tendências, interesses e sonhos dos jovens atuais, não os tornando questões exóticas ou ridículas. Conseguimos construir empatia por nos vermos naquelas pessoas. Outro ponto fundamental para narrativa é usar do ambiente, na favela de Rio das Pedras, Zona Oeste da cidade do Rio, como fator relevante para a trajetória vista em cena. Os jovens ali não tem a ambição de sair dali, justamente aquele lugar os torna quem eles são, portanto, faz parte de suas identidades.

As atuações são encantadoras, todos os jovens conseguem ser carismáticos. Particularmente, eu tenho certo receio de longas aonde você se identifica mais com a temática do que com os seus personagens. Contudo, é um dos raros casos aonde nos deparamos com uma direção de atores, juntamente a um elenco tão naturalista, gerando sentimentos genuínos vindouros da performance. São pessoas normais interpretando a si mesmas, de forma bárbara, demonstrando um vigor que, pessoalmente, não via fazia tempo.

A montagem dinâmica consegue compor uma narrativa envolvente, variando em diversos números sem soar cansativo ou desinteressante. Ela consegue dar voz e imagem para cada um dos personagens e de seus dilemas, usando o espaço da comunidade como choque desses conflitos e das pessoas. Novamente, é uma dinâmica que convida o espectador a adentrar no cotidiano daquela comunidade e por seus conflitos para fora, independente da idade de quem quer que esteja assistindo ao filme.

Chega a ser inacreditável o fato deste ser o primeiro longa da diretora Jo Serfaty. Ela desponta como uma realizadora com um frescor ao qual o cinema nacional, mais do que nunca, precisa. Em meio ao caos social e político do país, ver um filme retratando a realidade da geração que é o futuro dessa nação, soa como um alento, visto que por mais perdido que os jovens possam ser, há consciência, empatia e muita esperança.  Particularmente, pode parecer até exagerado, mas temos um coming of age que não deixa a desejar para os filmes americanos.

Confira aqui nossa cobertura do 8º Olhar de Cinema.

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