“The Flash” (2023); Direção: Andy Muschietti; Roteiro: Christina Hodson; Elenco: Ezra Miller, Sasha Calle, Michael Shannon, Ron Livingston, Maribel Verdú, Kiersey Clemons, Michael Keaton, Ben Affleck; Duração: 144 minutos; Gênero: Ação, Aventura, Fantasia; Produção: Barbara Muschietti, Michael Disco; País: Estados Unidos; Distribuição: Warner Bros. Pictures; Estreia no Brasil: 15 de Junho de 2023;
De todo o universo da DC que se tentou construir nos cinemas, entre mudanças literais na hierarquia do estúdio, bastidores conturbados, as mais diversas recepções e relançamentos de versões diferentes, um dos filmes que mais sofreu no processo talvez tenha sido exatamente aquele que viu sua principal estrela envolvida em polêmicas relacionadas a crimes de diferentes tipos. Depois de inúmeras trocas na direção, versões de roteiro e atrelado a mudanças obrigatórias no rumo de um universo cada vez mais confuso e com menos sentido, “The Flash” chega aos cinemas tendo a oportunidade de corrigir o trajeto de uma saga e comprando a briga da imagem manchada de Ezra Miller (“Animais Fantásticos: Os Segredos de Dumbledore”). É um filme que poderia funcionar, independentemente de tudo isso. Entretanto, o resultado é exatamente um reflexo de todos esses percalços que fizeram de sua realização um calvário, encontramos uma obra que é uma colcha de retalhos, com sobras daqui e dali, e que tenta, aos trancos e barrancos, ser minimamente funcional de alguma forma. A questão, no entanto, é que também não parece haver muito para onde seguir em frente, assim, é a indefinição que impera aqui e sem um objetivo claro o todo não consegue ser amarrado como devia.
Só que esses problemas se refletem também em diversos outros aspectos de “The Flash”, com decisões cuja resultado é embasbacante, escolhas gritantes que fazem o filme destoar negativamente em meio a espécie de crise pela qual os filmes desse nicho têm passando recentemente. Em determinada cena é como se alguém da produção tivesse visto a polêmica em torno de uma das cenas de “Thor: Amor e Trovão” que viralizou na internet ano passado, e achado uma boa ideia. Sintetizando, assim, tudo o que são os efeitos visuais do filme, os quais a qualidade faz com que se tornem algo que é preciso se assumir como caricato. Para algumas sequências, podia fazer sentido, mas em outras é perceptível como tudo fica muito aquém. E isso também se dá por conta do tom completamente conflitante em “The Flash”, por vezes é uma pegada que, de tão didática, parece direcionada ao público infantil, em seguida então temos piadas que vão de sexo e “larica” até cenas escatológicas. O humor parece o das refilmagens feita por Joss Whedon em sua versão do “Liga da Justiça”. E se o humor tem essa instabilidade toda, é difícil imaginar que a parte do drama seja efetiva, por isso mesmo a catarse narrativa não tem força.
No entanto, não é só culpa do roteiro de Christina Hodson (“Aves de Rapina”, “Bumblebee”), longe disso. Ela, inclusive, já mostrou uma capacidade de fazer algo além do que vemos aqui, diferente do diretor Andy Muschietti,(“IT” e “IT – Capítulo 2”) que parece mais interessado em agradar ao chefe do que criar alguma personalidade para seu filme. “The Flash” se assimila, de certa forma, à “Shazam! Fúria dos Deuses”, com um visual e cores genéricas, definitivamente sem identidade e perdido entre as indefinições do estúdio. Muschietti não consegue dar qualquer urgência ou peso às principais sequências do filme, e a emoção vem de uma maneira tão protocolar que soa indiferente. Suas limitações no comando no filme surtem em cenas incapazes de gerar alguma comoção de qualquer tipo, porque a construção delas carece não só dessa personalidade, mas de visão. Sem isso, o filme não pulsa e ecoa seu vazio, onde os principais atrativos são a nostalgia com participações de figuras que marcaram a história da DC nos cinemas (nas telas ou fora delas). Contudo, nem mesmo isso empolga e, pior, esse anseio recai até num retorno questionável e desnecessário, que soa mais desrespeitoso do que uma homenagem em si. Um resumo do quão conflitante e confuso é este filme que tardou a acontecer e, quando finalmente chegou sua hora, decepciona profundamente. A única boa notícia de toda a falta de perspectiva que temos em “The Flash” é que dificilmente veremos algo deste nível de novo… ou pelo menos assim quero acreditar.