Recentemente, conversei com meu melhor amigo sobre alguns daqueles filmes que são um “tapa na cara”, por seu discurso realista ao analisar o amor em toda sua plenitude. Concordamos que “Closer – Perto Demais (Mike Nichols, 2004)” era o tipo de filme desmantelador de estruturas, porém ele o considerou fatalista na sua forma de enxergar os sentimentos, característica que eu nunca percebi de fato. Revi a obra contemporânea de Mike Nichols, que infelizmente nos deixou no último ano, realmente eu percebi as proporções fatalistas e até pessimistas que o longa demonstra retratar. Para quem não viu, o filme aborda a vida de distintos casais que flertam entre si, causando a troca mútua entre os parceiros, a infidelidade e instabilidade são constantes na vida dos quatro, deixando a nós em duvidas em relação ao real amor entre os casais. Após a revisão é perturbador o realismo excessivo, mas muito bem elaborado que demonstra o quão conflituosas as relações monogâmicas (e possivelmente as poligâmicas) são quando o egoísmo predomina, uma parte tenta predominar perante outra, uma via de mão dupla acaba sendo apenas uma mão única na qual apenas um doa e o outro exige mais. Pode ser pessimismo, fatalista ou até desesperançosa, pelo simples fato de exigirmos demais dos outros quando pouco damos.
Em dado momento de Closer, Alice (Natalie Portman) é pressionada pela desconfiança de infidelidade por seu namorado (Jude Law), ele a sufoca a tal ponto que finalmente ela percebe seu egocentrismo, o amor morre a partir dai e só a resta partir. É uma das cenas mais devastadoras do longa por percebermos que as coisas, muitas vezes, estão visíveis ao olho nu, mas preferimos olhar para o lado por crer cegamente em mudança dos nossos parceiros, em acreditar que podemos fazer a diferença. Mike Nichols nos propõe que não podemos, simplesmente por estas pessoas verem o problema em nós e não nelas. Talvez por isso que doa tanto, ainda mais por não termos a resiliência de Alice em recomeçar do zero, sabendo que está mais forte para as próximas relações.
Em “Blue Valentine (Derek Cianfrance, 2010)” acompanhamos um casal em dois momentos: o primeiro da descoberta, onde eles vão se conhecendo e construindo seu amor e muito tempo depois o de exaustão, quando o relacionamento é exaurido e ambos estão em colapso. Particularmente, eu vi esse filme num momento significante na minha vida, me recordo que o filme estreou no dia dos namorados de 2011 com o infame título de Namorados para Sempre, tal que me recuso em chamar. O longa segue no realismo retratado na obra de Nichols, sobretudo em mostrar o nascimento do sentimento de forma inocente, pura e verossímil, na mesma forma que sua desintegração, seja devido a rotina, ao egoísmo ou a dificuldade em aceitar o outro como ele realmente é, não como imaginávamos/gostaríamos.
É um filme paradoxal, pois é extremamente romântico, ao mesmo tempo que doloroso, por mostrar como o amor pode nascer na mesma intensidade que desaparece, sendo o artifício mais interessante nos mostrar que a mesma coisa que une o casal (formado por Ryan Gosling e Michelle Williams) é aquilo que os destrói, corrói aos poucos até os dois estarem em estafa. Geralmente é assim mesmo, nos encantamos pela falsa estabilidade que o outro pode nos proporcionar, até ficarmos esvaziados, no meio do furacão instável. O realismo do longa ganha proporções maiores quando descobrimos que os atores principais foram obrigados pelo diretor para viverem juntos durante um mês, tendo um grande entroçamento, porém em dado momento eles simplesmente desmoronam todo aquele sentimento na frente da câmera, com a mesma dor que qualquer um passa. O diretor, aliás, fez o filme para entender a incompreensível separação dos pais, tornando o processo fundamental para a máxima compreensão da obra. Terminamos com muita dor, mas com muita inspiração, por ser possível construir uma relação tão inspiradora, mas atento ao próximo, ser empático torna-se fundamental.
Em “Annie Hall (Woody Allen, 1977)”, Ally (Allen) é um comediante com problemas afetivos, ele é um humorista judeu, faz análise há 15 anos e só consegue ter relacionamentos rápidos. Eis que ele conhece Annie (Diake Keaton), por quem se apaixona, no início eles vivem os melhores momentos, até que ela resolve ir morar com ele, sendo inevitáveis os problemas conjugais, com os dois entrando em colapso. Woody Allen reinventa a comédia romântica mostrando as diferentes fases de um relacionamento, os choques de gênios e exigências, com seu humor peculiar, é um filme divertido porém bastante melancólico, pois por mais que Annie e Ally sejam um casal em plena sintonia, eles não dão certo, pela dificuldade de ceder. Ela almeja ser cantora, ele não quer sair de sua zona de conforto e prefere ficar com os pés no chão, a ambição dela acaba desestabilizando a comodidade do outro que não tenta se adaptar.
A química de Woody e Diane é perceptível, eles chegaram a ter um relacionamento fadado ao fracasso pelos mesmos motivos do filme. Amar não é difícil, mas ceder sim. Justamente isso que faz os dois se separarem melancolicamente, Annie não quer rifar seus sonhos, prefere ser obstinada em tentar, já Ally não arrisca e quando percebe já é tarde demais. Mas eis que o amor que os dois cultivaram não morreu, é transformado numa fraternidade encantadora, ambos terminam grandes amigos e cientes que um fez a diferença na vida do outro, mesmo tendo falhado, saíram pessoas mais fortes e dispostas a mais. O longa termina com um monólogo histórico do personagem de Allen, replicado a seguir:
“-Depois disso ficou muito tarde e nós dois tivemos de ir.Mas foi ótimo ver Annie outra vez. Percebi a pessoa incrível que ela é, e como era bom poder conhece-la. E lembrei daquela velha piada, sabe? O cara vai ao psiquiatra e diz: ‘Doutor, acho que o meu irmão enlouqueceu, ele pensa que é uma galinha.
Por que você não o interna?” perguntou o médico. E o cara responde: Eu internaria, mas acontece que eu preciso dos ovos.’
-Então eu acho que é mais ou menos assim que vejo os relacionamentos amorosos hoje: eles são totalmente irracionais, loucos, absurdos, mas a gente continua tentando porque…a maioria de nós precisa dos ovos.”
No final das contas, o que a gente precisa mesmo é dos ovos, difícil acha-los, mas continuamos na busca intensa, cabe a nós apenas sermos mais empáticos, menos egoístas e realistas, como o cinema nos mostra. Há outros inúmeros filmes que se encaixariam aqui, porém escolhi aqueles que me marcaram ao ponto de revê-los ultimamente, espero que tenham gostado!