O Brasil é mais um país sofredor de várias crises econômicas cíclicas, se fazendo nítida decorrente do aumento da miséria e desigualdade social. Hoje em dia não é diferente, porém o que de fato significa a pobreza extrema, expressa pelo prisma de viver nas ruas como morador, sob condição marginalizada? O diretor Cristiano Burlan tenta em seu novo filme traçar dois paralelos: o de viver nas ruas por enxerga-las como forma de liberdade da opressão da sociedade que visa impor conceitos e valores atrasados e hipócritas; e a decadente de viver seguindo tais convenções. “Fome” trata-se de um híbrido documental, acompanhamos Joaquim (Jean-Claude Bernardet), mais um mendigo na cidade de São Paulo. Contudo, no decorrer do longa-metragem, nos deparamos com o fato dele não ser meramente “ninguém”, exatamente como a sociedade enxerga os moradores de rua. Ele é uma das caras anônimas que abdicaram de viver numa sociedade tão tóxica em prol da liberdade plena. O motivo no qual alguém faz isso é dever do espectador decifrar.

É intrigante o modo como se fotografa São Paulo, a exaltando como um gigante colossal, devorador, uma metrópole que enclausura seus indivíduos, simplesmente por perderem suas identidades a fim de serem aceitos nessa sociedade convencional e quadrada. Talvez por isso que muitos preferem fugir da realidade, seja usando drogas/entorpecentes, álcool ou usando outros métodos, o fazendo decair até o último degrau. É um longa no qual sua hipnotizante fotografia serve como narrador, expressando por si só o objetivo principal do longa. O problema é que Burlan não se contenta com isso e tenta estender o filme com um plot didático e desnecessário, sobre uma garota em busca de estudar a população de rua. Ele tenta “explicar” a mensagem ao público, soa constrangedor por questionar a capacidade do público, ainda mais numa temática com nuances e subjetividades.

Jean-Claude Bernardet encarna brilhantemente Joaquim, o construindo de forma empática e incisiva. Ele consegue carregar o filme nas costas, por sintetizar toda a argumentação do filme entorno de seu personagem, sem ser panfletário e nem senso comum. É um cinema experimental, mostrando mais uma face do novo Brasil, apesar dos avanços ainda carrega correntes do passado. “Fome” portanto é um grito para que tais correntes sejam enfim superadas. Assim seja.

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