Por Eduardo Gomes;
O escritor John Green ganhou notoriedade por seus livros palpáveis, melodramáticos e sentimentalistas tendo como alvo o público teen na passagem para a vida adulta, entre 15-18 anos. Contudo, sua literatura peca no problema de ser mais do que de fato é, manipula muito os sentimentos do leitor com muito pouco, construindo situações banais recheadas de hipérboles e transbordando pretensão sentimentalista, tal essência foi sentida recentemente na adaptação de “A Culpa é das Estrelas”, um bom filme juvenil, porém extremamente manipulativo e choroso. Eu não cheguei a ler a obra original antes de assistir ao longa, mas podemos dizer que “Cidades de Papel” é uma obra madura em sua pretensão e execução, atingindo em cheio o seu público alvo, mesmo carecendo de uma argumentação mais sólida -talvez pelas origens- não deixa de ser um interessante retrato dessa nova geração, além de abordar alguns assuntos universais e dissociada à idade.
Quentin (Nat Wolff) é um jovem como muitos outros de sua idade, metódico, pouco inventivo, padronizando a felicidade em um casamento, carreira bem sucedida e construção de família. Ele sempre foi apaixonado por sua vizinha Margo (Cara Delevingne), levando um estilo de vida oposto ao dele, se aventurando, arriscando, desvendando… Enfim, explorando os limites que a vida pode oferecer. Contudo, após uma noite no qual os dois se conectam de forma única, ela simplesmente desaparece, deixando uma série de “pistas“ , interpretadas de um convite para ser encontrada, eis que Quentin arranja coragem e ousadia para enfrentar uma odisseia não só no encontro da amada, como também no encontro de si próprio, da maturidade, dos momentos únicos, as experiências que ele sempre se privou enfim acontecerão. É uma premissa simples, pode parecer até insossa de primeiro modo, só que é interessante nos depararmos o quão simples de fato a vida é, uma jornada constante e diária, cabe a nós decidirmos como ela será.
O maior mérito do longa é a direção de Jake Schreirer, do indie Frank e o Robô, que consegue dar uma profundidade maior que a obra original aparenta ter, dando um tom oitentista ao longa, homenageando de certa foram inúmeras obras clássicas da juventude da época, como o Clube dos Cinco e os Goonies, há um tom de mistério na trama ao mesmo tempo que reflexão, induzida ou não, nos faz pensar sobre os rumos da vida seguidos, como exaltamos certas pessoas quando simplesmente elas são iguais, a carência de coragem para ousarmos e sairmos de nossa zona de conforto. O longa é, portanto, uma ode à juventude que opta por viver aproveitando o que a vida tem, não significa em fugirmos de responsabilidades, apenas que não podemos nos submeter a uma existência pautada apenas em cumprir deveres, passa a ser fundamental nos libertarmos dessas amarras e construirmos uma vida para além do básico e dos padrões banais. Outra escolha feliz do roteiro é a exaltação da amizade, um pilar principal para todos, independente de idade, particularmente eu nada seria se não fosse pelos conselhos, abraços e broncas dos meus sinceros amigos, um dos pilares principais que me sustentam, quem se coloca nessa situação deve sentir o mesmo, acredito.
Cidades de Papel, contudo, tem como defeito principal não ousar, indo na contramão de seu discurso, pode ser justificável por se um produto, um filme de estúdio comercial, porém decepciona em percebermos o tamanho do potencial se fosse um filme genuinamente próprio e sem amarras. Mas, para não ser chato, acredito que o longa seja bastante agregador e refletivo, é maduro e abre espaço para debates e discussões, por isso vale a pena assistir, só que os fãs de John Green que esperam uma nova Culpa das estrelas porém sair decepcionados, pois não há melodrama e nem sentimentalismo barato, apesar de permanecer com a auto-ajuda juvenil. Gostando ou não, é um fenômeno que parece não ter data de vencimento.
NOTA: 6,0/ 10,00.
Por Carlos Pedroso;
Tem algum tempo que não escrevo sobre cinema, mas ontem vi Cidades de Papel e me encontrei diante de algumas reflexões sobre o curso dos coming of ages no cinema americano. Essa nova safra de filmes adolescentes me parece realmente interessada em compreender a natureza juvenil e remodelar sua própria linguagem, como os melhores exemplares dos anos 90/início dos anos 00 o fizeram. E esse frescor que o gênero voltou a ter se deve muito a imprescindível leveza que filmes como Cidades de Papel tem tido na construção de seus personagens.
Embora limitado em sua amplitude, devido ao fato de ser uma adaptação de um best seller do John Green, me cativa muito como Jake Schreirer encontra sempre em elementos pré concebidos uma maneira de relacioná-los aos sentimentos e ações daqueles adolescentes. Se por vezes vemos a câmera se mover num travelling em slow motion numa cena com uma canção pop ao fundo é porque existe uma compreensão do tempo sendo dilatado que cabe à dimensão de tal sequência. E o fato de Schreier misturar vários elementos de gêneros também, desde uma sequência misteriosa num antigo armazém abandonado ao alívio cômico de ter os personagens cantando o tema de Pokémon, ou dum diálogo sobre a sua trajetória no ensino médio e as incertezas do futuro na universidade e da própria amizade entre eles, se estabelece um ensaio fílmico afim de resgatar aquele sentimento nostálgico dos filmes do John Hughes, que até hoje dizem muito sobre a vida adolescente.
Para além desse olhar compreensivo que Schreier lança para as problemáticas daqueles personagens, em especial os masculinos, é excepcionalmente sobre as figuras femininas que o filme encontra seu real poder dialético. Não precisamente através da desconstrução de clichês e estereótipos, mas por simplesmente não idiotizá-las ou colocá-las como seres meramente sentimentais, encontramos um contraponto (a mitologia da personagem da Cara Delevingne, quase como se ela tivesse saído de uma canção da Taylor Swift) bastante revolucionário pro que se espera para o futuro da linguagem do gênero e sua renovação diante de novos tempos, onde o respeito e a empatia devem se tornam catalisador de toda a essência da auto estima juvenil.
NOTA: 7,0/ 10,00.
MÉDIA GERAL: 6,5/ 10,00
TRAILER LEGENDADO:
1 Comment
Pingback: Festivalizando | Artista do Desastre (2017) - Cine Eterno