“Duna: Parte Dois” (“Dune: Part Two”, 2024); Direção: Denis Villeneuve; Roteiro: Denis Villeneuve e Jon Spaihts; Elenco: Timothée Chalamet, Zendaya, Rebecca Ferguson, Josh Brolin, Austin Butler, Florence Pugh, Dave Bautista, Christopher Walken, Léa Seydoux, Stellan Skarsgård, Charlotte Rampling, Javier Bardem; Duração: 167 minutos; Gênero: Ação, Aventura, Ficção Cientifica; Produção: Mary Parent, Cale Boyter, Denis Villeneuve, Tanya Lapointe, Patrick McCormick; País: Estados Unidos; Distribuição: Warner Bros. Pictures; Estreia no Brasil: 29 de Fevereiro de 2024;
Denis Villeneuve aos poucos se tornou um queridinho de Hollywood, primeiro adentrou de maneira sutil nas graças do cinema estadunidense, com filmes até intimistas, depois, mesclou isso em “A Chegada”, quando tocava de vez na ficção científica, o gênero que o tornará, sem dúvidas, um nome reverenciado por décadas, assim como foi com Ridley Scott e seu “Blade Runner”, que finalmente recebeu uma continuação, pelas mãos do próprio Villeneuve, com o aclamado “Blade Runner 2049”, credenciando o cineasta franco-canadense a arriscar, através da Warner Bros. Pictures, a tal “impossível” adaptação de “Duna”.
O resultado foi uma bilheteria consistente para a retomada aos cinemas após o ápice da pandemia de Covid-19, a garantia de uma sequência para o filme – que era uma história, de fato, inacabada, e algumas categorias do Oscar. É em cima disso tudo, portanto, que “Duna: Parte Dois” chega – adiado após greves em Hollywood -, recheado de expectativas não só como uma história que servirá de clímax, mas que pode acrescer a toda uma qualidade cuja potencial aparentava imensurável, sendo que agora pode tirar proveito de uma narrativa menos preocupada em estabelecer regras e explicações sobre o Universo de “Duna” e desenvolver uma narrativa melhor sobre seus protagonistas e suas histórias.
A expectativa em torno de “Duna: Parte Dois” era de que Denis Villeneuve conseguisse tornar tudo em seu filme menos burocrático e protocolar, com relações já bem estabelecidas e as tramas traçadas, a impressão que ficava ao fim do primeiro filme era de que agora receberíamos algo que quase não havia ali. Entretanto, Villeneuve entrega em boa parte dessa continuação um repeteco do que já vimos, com algumas sequências de ação mais individualizadas e pessoais aqui e ali, mas que no fim funcionam mais pela sua forma do que pelo conteúdo, quando mais uma vez suas imagens falham em traduzir qualquer sentimento que tenha resquícios de humanidade.
É uma dinâmica muito unidimensional, e preto no branco, sobre certo e errado, sendo que até o vilão de Austin Butler (“Elvis”) é, não ironicamente, introduzido numa sequência de P&B. Todos os personagens que Villeneuve nos apresenta são uma coisa só e nunca demonstram uma capacidade de empatia, não é à toa que Javier Bardem (“A Pequena Sereia”) seja o mais cativante aqui, afinal, seu personagem torna-se num alívio cômico recorrente e que funciona porque o ator está se divertindo em cena. No entanto, em todos os outros momentos não há quaisquer semblantes de emoções no rosto de qualquer um do elenco. Ou se é maniqueísta ou se é uma ferramenta extremamente burocrática de roteiro que sinaliza uma boa virtude.
Algo que serve exatamente bem para explicar a relação amorosa entre os personagens de Timothée Chalamet (“Até os Ossos”) e Zendaya, que, por mais que a atriz tente, nunca realmente nos convence desse amor e é burocrática justamente porque depois serve para um único propósito narrativo. Porém, sem qualquer nuance, Villeneuve falha ao abusar de um dos elementos narrativos mais cafonas e que apela a emoções baratas. Essa ineficácia permeia o filme todo e é realmente uma pena que assim seja, porque “Duna: Parte Dois” é até mais inspirado tecnicamente do que seu antecessor. Se a trilha sonora de Hans Zimmer realmente fica aquém da originalidade do primeiro filme, todo o restante é um feito bárbaro de se assistir. Desde os sets, aos figurinos e direção de fotografia, à maneira como o som funciona e impacta a todo momento possível, enquanto a edição é sempre funcional e constrói cenas de ação de tirar o fôlego, porém, mais uma vez, pela sua forma, e não o conteúdo.
De certa forma, Denis Villeneuve até atinge seu objetivo, o de construir um filme com imagens capazes de contar uma história, mas elas falam da ação, do ato de seus personagens. O poder imagético delas, no entanto, é de uma beleza vazia, que não se traduz em nada porque nenhuma palavra no filme quer dizer algo. Num universo cheio de simbolismos e rico na forma como essas culturas se comunicam, “Duna: Parte Dois” falha em estabelecer qualquer diálogo que seja capaz de transmitir o que são as pessoas que constroem esses signos. É como um falso messias, que vende nada mais do que irresistíveis ilusões, vazias em sua realidade.
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