Talvez a maior virtude de “Étangs Noirs”, filme belga co-dirigido por Pieter Dumoulin e Timeau de Keyser, seja a maneira de encarar seu ambiente e seus protagonistas como quaisquer outros, cidadãos que integram uma sociedade como em variadas partes do mundo. O cenário aqui em questão é um complexo de moradias sociais onde a grande maioria dos habitantes é composta por imigrantes que tentam levar a vida com o pouco que ganham. Vivendo em apartamentos minúsculos e apertados, alguns em condições mais precárias, às margens de uma sociedade que os encara com desdém e desprezo. Merecem mais que isso. Ainda que isso tudo esteja ali, visível e perceptível aos olhos, nada disso faz, exatamente, parte integral da narrativa -como o próprio Dumolin afirmou após a sessão- não é seu lugar debater as condições reais que servem como pano de fundo, sem qualquer função, de seu filme. No entanto, também parece uma forma boba de ignorar tudo que ali se encontra, num conflito de realidade e ficção, onde por mais que aqui encontremos uma história ficcional, seus transeuntes são figuras que não só integram, mas compõem e fazem daquele cenário o que é. Um desperdício, dado o que vemos, de fato, decorrer durante o filme.
“Étangs Noirs” nada mais é que um exercício de gênero, e aí Dumolin e Keyser até tem algum mérito, afinal, fazem uso de diversas ferramentas cinematográficas para controlar o que se pode encarar quase que como um thriller, onde o ambiente se faz importante por um único fator: o espaço ocupado pelos personagens, literalmente. Seja nos apartamentos, ou nos corredores apertados das estações de metrô, a câmera é sempre dinâmica e prefere estar em constante movimento, delineando uma narrativa que se faz mais física que qualquer outra coisa. O protagonista aqui podia ser qualquer um, e todo e qualquer pré-conceito cabe apenas ao público. É uma pena que assim seja, pois se vê aqui desperdiçada tremenda oportunidade. A dupla de realizadores acaba muito mais por estar se divertindo do que realmente fazendo qualquer afirmação, uma dupla de colegas que faz do complexo algo apenas simplório, cuja correria leva a lugar nenhum, cuja a experiência não se apresenta como uma recompensa, tanto para o espectador como o próprio filme. “Étangs Noirs”, por mais que queira não parecer, é recheado de ambições poéticas, mas o que nos diz pouca diferença, de fato, faz, aquilo que chama atenção recebe a outra face. Uma pena!