Temporada (2018); Direção: André Novais Oliveira; Roteiro: André Novais Oliveira; Elenco: Grace Passô, Russo Apr, Rejane Faria, Hélio Ricardo, Ju Abreu, Renato Novaes, Sinara Teles, Janderlane Souza; Duração: 113 minutos; Gênero: Drama; Produção: André Novais Oliveira, Gabriel Martins, Maurílio Martins, Thiago Macêdo Correia; País: Brasil; Distribuição: Vitrine Filmes; Estreia no Brasil: 17 de Janeiro de 2019;
O cinema nacional vem se reinventando a cada ano, com produções cada vez mais inventivas, seja do ponto de vista meramente estético ou temático – ou ambos. O mineiro André Novais Oliveira é um cineasta promissor, em seu primeiro longa “Ela volta na Quinta (2014)” ele documenta a crise conjugal dos próprios pais a fim de compreende-la e achar uma solução. É uma obra singela por conseguir ser pessoal, ao mesmo tempo que universal, por abordar um tema de fácil identificação: o afeto. Agora, no seu segundo longa-metragem, sua primeira ficção, em “Temporada” Novais segue a construir seu cinema abordando o banal do cotidiano, a simplicidade das coisas, entorno de personagens comuns, de fácil identificação em nossas vidas, num universo real.
Juliana (Grace Passô) é uma agente de saúde recém chegada em Contagem, interior de Minas Gerais. Sua tarefa é conscientizar e combater os focos de mosquito da dengue, um trabalho pouco usual. Paralelamente, ela aguarda o retorno de seu marido, que deve chegar a qualquer momento. Seguindo seu dia à dia, ela vai começando a criar vínculos na cidade, contudo segue bastante interiorizada, guardando suas emoções e pensamentos para si, ciente de que alguém ou algo está para vir ou acontecer.
A grande “temporada” do título é a ficha que cai para Juliana, aos poucos, que as coisas não são como nós queremos. E acabamos por ter a consciência, por bem ou mal, que certas coisas são temporárias em nossas vidas. Contudo, há outras coisas que não são. Então é preciso se ater justamente a isso. Sobretudo nas oportunidades que aparecem em sua vida: o emprego, as amizades, a própria nova cidade. O roteiro além de ser assertivo na construção da personagem, consegue ser inventivo em suas abordagens, dando nuances políticas para atos banais, como sobre a burocratização do Estado e dos demais serviços, inclusive de seus agentes públicos. A escolha estética dos personagens se tratarem de indivíduos comuns, inclusive vividos por grande maioria de não atores, é uma questão de representação, no modo que nos sentimos representados, como seres banais, donos das próprias escolhas, animais políticos, porém não necessariamente politizados.
Outro grande mérito do longa é ser realizado justamente aonde aqueles indivíduos habitam, aumentando a questão do realismo. Um dos grandes achados é Russo APR, que interpreta um dos amigos de Juliana, bastante carismático e expressivo. A fotografia consegue transformar Contagem num paraíso, uma Miragem, um sonho efêmero, literalmente uma temporada. Seja ela breve ou não. O grande destaque fica por conta da grandiosa atriz Grace Passô (Praça Paris), um monumento da atuação. Sua performance consegue dar inúmeras facetas a sua personagem, há um mundo em suas faces, enxergamos sua agonia ao mesmo tempo que sua alegria. É uma atriz que consegue usar o corpo de forma expressiva, arrumando diferente formas de se expressar em cena, a cada momento.
“Temporada” é um dos filmes mais criativos e inovadores dos últimos anos, principalmente por ser um belo reflexo de nós, como sociedade brasileira. É um filme aonde o povo está ali, relevado e escancarado na tela. Além disso, é um alento saber tamanho potencial dos novos realizadores brasileiros, sabendo dos próximos anos que virão, é preciso que haja bastante reinvenção, tematicamente, esteticamente e também como forma de produção. Assim como houve no cinema novo durante a ditadura, no cinema marginal durante o AI-5, e por aí vai. Que haja resistência e efervescência cinematográfica e cultural nos próximos anos. Que seja apenas uma má temporada, porém breve.
“Temporada” – Trailer Oficial: