Colaboração especial de Renan Santos.

O texto a seguir contém spoilers.

Não saberia como começar a crítica dessa temporada de Masters of Sex sem comparar com a época no ano passado na qual assisti a série. Em 2014 a intenção era fazer uma crítica do segundo ano da série. O que aconteceria, não fosse um colapso nervoso resultando num estado depressivo que me assombra e me acompanha de perto até hoje. Pouco mudou em um ano, ou mais ou menos isso, ao menos na minha vida. No entanto, o que mudou ajudou a melhorar um pouco as coisas. Mas o que nunca mudou foi o quanto eu aprecio a subestimada Masters of Sex e o trabalho exímio de personagens que ela realiza.

Como fez bem aos personagens, aliás, a passagem de tempo da série. Neste terceiro ano os filhos de Virginia Johnson (Lizzy Caplan) já estando na puberdade abrem portas para novos caminhos, que Masters of Sex exploraria muito bem, ou deu indícios de que faria, não fosse tão cautelosa. A série tem esse problema. Ela é a representação de algo, então reluta em abrir mão, completamente, da realidade na qual se baseia. Até porque mexe com reputações e histórias de vida. É, afinal, uma obra significativa. Por isso mesmo precisa relembrar ao público que parte de sua trama é somente uma ficção.

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Mas mesmo sendo somente uma ficção Masters of Sex consegue, mais uma vez, transpor o quanto a ignorância impossibilita o desenvolvimento do conhecimento do corpo humano. Os momentos mais tristes em Masters of Sex são aqueles que retratam que entre os anos 50 e 70 haviam certos tabus difíceis de serem quebrados e que, até os dias de hoje, pouco mudaram. Então, com um pouco de boa vontade percebe-se o quanto é simples se ultrapassar certas barreiras, que precisam ser deixadas de lado para que se entenda não somente frustrações sexuais, mas psicológicas.

Porque se tem algo que Masters of Sex faz, mesmo quando não dá a entender que está fazendo, é mostrar como o ser humano é uma conjunção do físico com o psicológico. A relutância em entender isso resulta, portanto, na crença de ilusões fantasiosas ao invés da realidade que se apresenta a nós. Mas até os personagens aparentemente mais bem centrados e cultos acabam deixando a realidade passar desapercebida bem em frente a seus olhos. Por isso mesmo Bill Masters (Martin Sheen) acabou tendo momentos mais chocantes para o público do que para seu personagem no season finale do terceiro ano.

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Não diria que é fácil gostar do personagem principal, porque não é. Longe de ser um anti-herói, Bill Masters é um ser humano como qualquer outro, só que muito mais danificado que a maioria. Bill está quebrado. Ele parecia ser o único a não compreender isso. Como um estudo de personagem, Bill Masters é incrível e, com o final da terceira temporada, é possível que seja nos entregue algo mais incrível ainda. Apesar de, finalmente, ter desistido de se levantar, acredito que a queda vem em um momento certo, mas se sucederá um retorno triunfal. Mas estas são as minhas esperanças.

Independentemente disso, Martin Sheen deu um show de atuação durante toda a temporada, mas culminado em Full Ten Count em algo soberbo. É realmente chocante, para o público que sabe o que se passa na vida de dona de casa da Libby (Caitlin FitzGerald), ver a reação de Bill Masters quanto a sua inocência em tudo que ele descobre, e que não é nada nem próximo daquilo que sabemos. Essa relação ainda não acabou e acredito que vá gerar ainda muita polêmica e momentos memoráveis. O que me preocupa é uma partida precoce da personagem de Caitlin FitzGerald.

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Gostei da maneira como, mais uma vez e não sem fundamentos, foi explorada a infidelidade por parte da esposa de Bill Masters. Porque ela não é somente a esposa de Bill Masters, Elizabeth Masters é também um ser humano e com os mesmos direitos que seu marido. Mãe, dona de casa e enxotada pelas atitudes de Bill, ela representa um casamento fadado ao fracasso, não fosse pela sua infidelidade, que a mantém fiel ao seu marido por satisfazer às suas necessidades, necessidades essas que são as mesmas de qualquer outro ser humano, mas negadas a ela por seu marido. A personagem de Caitlin FitzGerald é uma das mais profundas da série.

Assim como acabou se mostrando a nova adição, Dan Logan (Josh Charles). Que apesar de parecer ser um ótimo partido para Virginia, até por Josh Charles ter entregue ótimas atuações, acabou gerando dúvidas após a bem-vinda e divertida participação especial de Judy Greer, como a esposa do investidor de Masters e Johnson. A forma como o roteiro da série trabalhou suas atitudes e as atirou na cara de Virginia como artimanhas de um garanhão, acabou colocando tudo em xeque. Se era verdade ou se fomos enganados, só o quarto ano da série nos dirá, quando veremos qual o resultado da relação de Dan e Virginia.

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Dúvidas também recaem em torno de Tessa (Isabelle Fuhrman), filha de Virginia. A garota, aliás, é protagonista de uma trama que talvez não tenha ficado tão evidente. Ela é uma personagem tão mais interessante que seu irmão, justamente por ser mulher. O homem possui certa liberdade, sempre foi assim. Mas chega até a ser constrangedor as situações às quais Tessa é submetida em Masters of Sex, pela simples circunstância de ser mulher. O que reflete exatamente a mesma posição em que, já adultas, todas as outras mulheres da série são colocadas. Explorar a puberdade de Tessa é expor o quanto o machismo se impregnou na sociedade, mesmo em situações que não parece estar lá.

Tanto é que Virginia Johnson acaba ficando na berlinda. Sempre sendo vista como inferior. Mas a força de Lizzy Caplan sintetiza a força de vontade da personagem. Num trabalho onde Masters of Sex mostra que não se pode abaixar a cabeça e é preciso continuar a lutar e lutar. Virginia ainda não superou, em seu coração, Bill. É verdade. Entretanto, mostrou a ele que sua vida é independente. E Bill teve de deixa-la voar, metafórica e literalmente. As coisas mudam, desde que não nos conformemos com a situação e nos deixemos acomodar. Masters of Sex serve para relembrar que a revolução sexual de Masters e Johnson ainda não acabou, é necessário que continuemos a lutar pela difusão do conhecimento ao qual não somente temos direito, mas que nos torna melhores seres humanos.

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