“Os Arrependidos” (2021); Direção: Armando Antenore, Ricardo Calil; Roteiro: Armando Antenore, Ricardo Calil; Elenco:–; Duração: 83 minutos; Gênero: Documentário; Produção: Pablo Iraola; País: Brasil; Distribuição: –; Estreia no Brasil: –;
A comissão da verdade foi um pacto de classes pelo esclarecimento dos fatos no regime militar. As vítimas do cruel estado ditatorial e seus Atos Institucionais, os famosos AI, cederam o justo direito de punir os detratores pela enfim descoberta do destino dos diversos desaparecidos. Uma das mais evidentes diferenças entre o Brasil e os demais países que sofreram com intervenções promovidas pelos Estados Unidos durante a Guerra Fria.
Entre os diversos episódios detestáveis por parte do Estado nesse período estão os Arrependidos. Jovens da guerrilha armada que, foram tal ponto nos porões do DOI CODI, abandonaram a luta para se tornar garotos-propaganda do regime. Uma tática que se assemelha muito às campanhas anti-drogas que põe ex-usuários para conversar em locais de grande alcance e divulgar desinformação em forma de relato pessoal. O documentário dirigido por Ricardo Calil e Armando Antenore busca esclarecer essas figuras que ficaram à margem de ambos os lados.
Como o filme deixa explícito em letreiros aos 10 minutos: Para a direita, propaganda; para a esquerda, traidores. Uma questão tão importante quanto o acolhimento a essas figuras que tiveram sua humanidade retirada por dias com o aval da lei não poderia ser tratada de forma tão monótona. A ordem que a montagem entrega o filme é quase um filme dispositivo, preso a um circuito de condições que enaltecem a inventividade dos diretores. Aqui, apenas torna um tema tão importante quanto a máquina de propaganda de regimes autoritários em apenas entediante. Como já foi dito em outro texto sobre o festival, a impressão é de estar vendo um filme que apenas usa sua imagem como forma de background para o trabalho em podcast.
A dita lógica em circuito é dogmática: Imagens de arquivo dos arrependidos, imagens dos mesmos hoje dando seus relatos, propagandas militares e aparições dos ex-guerrilheiros na televisão. Pouco se usa das imagens feitas para o filme com o viés de capturar algo implícito ali, uma discussão que sempre está isolada à superfície da palavra. Muito pouco para quem abre o filme falando sobre o peso de seu próprio documentário antes do início da sessão. Ouvir um dos entrevistados falando sobre não acreditar mais na causa deveria ser um momento de embrulhar o estômago, a prova cabal de alguém que foi punido por ter convicções libertárias, mas apenas soa um discurso que endossa o falso paralelo entre as partes.
O monólogo final é uma pequena fagulha, algo que não ocorre em larga maioria do tempo de tela: Justiça pela memória de homens que foram renegados por terem sido reduzidos a seu lado mais primitivo de sobrevivência, fazendo contraposição em rede nacional às suas crenças. Homens complexos e cinzas receberam uma abordagem quadrada e jornalística, reduzindo-os aos paralelos mais óbvios com o período atual.