O Juízo (2019); Direção: Andrucha Waddington; Roteiro: Fernanda Torres; Elenco: Felipe Camargo, Carol Castro, Fernanda Montenegro, Lima Duarte, Joaquim Torres Waddington, Criolo; Duração: 90 minutos; Gênero: Suspense; Produção: Andrucha Waddington, Leonardo M. Barros, Maria Amélia Teixeira, Renata Brandão; País: Brasil; Distribuição: Paris Filmes; Estreia no Brasil: 12 de Dezembro de 2019;
As nove décadas da fenomenal Fernanda Montenegro, única atriz brasileira indicada ao Oscar de melhor atriz, não impossibilitam a mesma de embarcar em projetos, no mínimo, questionáveis. Fica ainda mais lamentável quando a sua filha, a também atriz e roteirista Fernanda Torres escreve o roteiro e ainda chama seu filho, neto de Montenegro, para estrelar um filme cujo seu marido, Andrucha Waddington dirige. Um filme com a marca e pedigree da família, porém, é um espetáculo de equívocos dos mais absurdos possíveis. “O Juízo” é um filme que nem de intenções boas parece vir a ter. Acaba sendo algo de extremo mal gosto, para não dizer arrogante e banal. Se anos atrás, Daniela Thomas e seu “Vazante” polemizaram a cena cinematográfica nacional entorno de um debate racial embranquecido, o mesmo se faz aqui.
O longa acompanha uma família, aonde o pai (Felipe Camargo), um dependente de álcool em recuperação, decide ir para a antiga propriedade da família, no meio do interior do Rio de Janeiro, num casarão aonde sequer há eletricidade – o contraste de ser um filme patrocinado pela companhia de energia do Estado do RJ soa ainda melhor. Sua esposa (Carol Castro) e filho (Joaquim Torres Waddington) o acompanham, tendo que se adaptar ao local inóspito. Os antepassados daquela família eram escravocratas e cometeram assassinato a sangue frio da esposa de um ex escravo (Criolo), então o espírito deste o acompanha há décadas querendo uma alma em troca daquela que lhe foi tirada. A maldição recomeça nesta nova geração, a cobiça é o principal sentimento de todos.
A ideia original seria de um pirata holandês e seu tesouro escondido na mesma ambientação. Acabou mudando para esse filme que mistura suspense, debate racial, espiritismo e ocultismo. Flerta em “Corra!” e “Nós“, de Jordan Peele, acerta no extremo oposto dos dois. Num filme tão banal, aonde a construção coesa dos dois atos é desconsiderada de forma demolidora num terceiro ato devastador – no pior sentido possível. Não há o menor direcionamento para aonde ou por onde o longa quer ir, aparenta ser gratuito, tanto em seu debate raso do ex escravo tentando a vingança -o tal juízo- quanto na questão da cobiça que corrompe os homens e os tornam monstros. Pobre.
De bom, não dá para dizer que a presença da sempre magnética Fernanda Montenegro não agregue, por menor que seja. Além disso, temos uma ambientação interessante, consegue construir uma tensão, até curiosidade. O problema é justamente o que vem depois, as respostas, as conveniências, o desfecho. Tudo tão raso, fica a tristeza de um projeto com tamanho potencial ser um amargo fracasso. Ficou o desejo para saber qual seria a estória do pirata, talvez essa desse certo.
“O Juízo” – Trailer Oficial:
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