É incomum ver Paul Thomas Anderson realizando um filme contemporâneo, a última vez, inclusive, foi em 2002 com “Embriagado de Amor”, desde então ele entregou 5 filmes de período variando entre diversas temáticas, mas talvez sem nunca entregar algo tão extraordinário como “Sangue Negro”, ainda que quaisquer uma de suas produções, como “Licorice Pizza”, “Trama Fantasma” ou “Vício Inerente”, nunca tenham sido algo menos do que ótimo. O cineasta, talvez, também nunca tenha sido tão eloquentemente político como em “Uma Batalha Após a Outra”, então é meio que sintomático que ele retorne ao cenário contemporâneo, em um filme que traça claros paralelos e é tão destemido quanto o atemporal “A Batalha de Argel” (1966), uma das principais inspirações para este filme. Se não há revolução sem sangue, Paul Thomas Anderson (ou PTA) constrói um filme cuja violência se alastra por gerações, mas que não é uma particularidade somente dos atos aqui, mas de um retrato falado do que é o Estados Unidos da América e que demonstra que a luta de classes precisa ser, também, racial. Uma coisa está ligada a outra e há batalhas tanto grandes como pequenas, mas sem perder de vista quem dá as cartas por detrás das cortinas, causando esse efeito dominó que consome a sociedade.

“Uma Batalha Após a Outra” conta a história de um casal integrante de um grupo revolucionário, Perfidia (Teyana Taylor) é a centelha explosiva que lidera o grupo em suas empreitadas, enquanto Bob (Leonardo DiCaprio) é o especialista em explosivos da equipe, nada surpreendente, portanto, que os dois se apaixonem. O fruto dessa relação é Willa (Chase Infiniti), filha mestiça do casal, mas ela não é a única consequência desse relacionamento, que também traz à tona o coronel Steven J. Lockjaw (Sean Penn), culminando numa jornada que perdurará por mais de uma década. Esse conflito de gerações é essencial para o funcionamento do filme, porque destrincha como cada geração lida com os enfrentamentos de sua época e, mais, como ecoa cada ato de uma geração na outra. A conformidade ou a inconformidade que consome alguém são escolhas ou são os acontecimentos da vida que moldam isso? O privilégio desempenha qual papel? Por que se só damos valor à liberdade quando a perdemos, qual o maior motivador para continuar a se empenhar numa batalha após a outra? Seria isso que fomenta o ódio cada vez mais crescente, com ações reacionárias gritantes frente ao progresso conquistado a árduas mãos?

Enquanto alguns questionamentos são óbvios, Paul Thomas Anderson faz questão que outros não sejam tanto, num trabalho que é complexo e recheado de camadas, com uma gravidade que nem sempre se fez presente em seus filmes, como se o momento de algo acontecer fosse agora, um momento impossível de se deixar ser isento ou de ficar indiferente. Tudo isso, entretanto, é desenvolvido através da classe que o cinema de PTA sempre apresentou, com certa irreverência, o que permite, por exemplo, que o personagem de Sean Penn não caía num puro maniqueísmo, e que o ator possa explorar diferentes nuances mesmo que continue a ser um vilão ameaçador, não é empatia o que se pede de nós para com ele, mas que percebamos essas falhas de caráter que formam a representação dessa fragilidade masculina heteronormativa estadunidense que quer purificar o mundo. É um pouco caricata, mas de uma forma na qual tanto PTA como Penn sabem lidar para tornar o personagem não só efetivo, mas pungente, resultando naquela que é, sem dúvidas, uma das melhores atuações de sua carreira.

Por outro lado, há a sobriedade cômica de Benício Del Toro (“Esquema Fenício”) e a impactante dramaticidade de Regina Hall, ainda que sejam personagens mais pontuais, porém, que deixam um gostinho de quero mais e fazem a duração do filme nem parecer tanta assim. É na dinâmica do relacionamento do trio Taylor, DiCaprio e Infiniti, entretanto, onde “Uma Batalha Após a Outra” se transforma no grandioso épico que é. A maneira como os personagens se complementam e a tensão que é criada por Paul Thomas Anderson, principalmente em uma das sequências de perseguição mais intensas e bem filmadas que já vi no cinema, onde é impossível não sentir a tensão passando pelo seu corpo todo. O embate pela busca de um pelo outro é o que torna “Uma Batalha Após a Outra” um filme explosivo e, por fim, emocionante.
“Uma Batalha Após a Outra” – Trailer Legendado:
“Uma Batalha Após a Outra” (“One Battle After Another”, 2025); Direção: Paul Thomas Anderson; Roteiro: Paul Thomas Anderson; Elenco: Leonardo DiCaprio, Sean Penn, Benicio del Toro, Regina Hall, Teyana Taylor, Chase Infiniti; Duração: 162 minutos; Gênero: Drama, Suspense, Thriller; Produção: Paul Thomas Anderson, Adam Somner, Sara Murphy; País: Estados Unidos; Distribuição: Warner Bros. Pictures; Estreia no Brasil: 25 de Setembro de 2025;