“Estômago 2 – O Poderoso Chef” (2024); Direção: Marcos Jorge; Roteiro: Marcos Jorge, Bernardo Rennó, Lusa Silvestre; Elenco: Nicola Siri, João Miguel, Violante Placido, Paulo Miklos, Giulio Beranek, Guenia Lemos, Marco Zenni; Duração: 130 minutos; Gênero: Comédia, Crime; Produção: Cláudia da Natividade, Francesco De Blasi; País: Brasil, Itália; Distribuição: Paris Filmes; Estreia no Brasil: 29 de Agosto de 2024;
“Estômago” foi um filme marcante para o cinema nacional, mas certamente ainda mais marcante para os curitibanos, com incansáveis coberturas locais sobre o filme que fora realizado na cidade e seu subsequente sucesso, com certeza uma influência na carreira de muitos dos nomes que hoje vemos creditados nos bastidores da sequência do filme de 2007. Coincidência ou não, foi justamente Curitiba que o cineasta Francis Ford Coppola visitou no início dos anos 2000 para tirar algumas inspirações para seu filme que só teve sua estreia em Cannes este ano, praticamente duas décadas depois de sua visita. “Megalopolis” não tem muito a ver com “Estômago”, acredito eu, com Curitiba, só o tempo dirá, mas acredito que as chances são poucas também, visto o quanto a cidade definhou. Há tudo a ver, no entanto, entre a sequência do filme de Marcos Jorge e a obra-prima de Coppola, “O Poderoso Chefão”, e se as duas coisas estão ligadas propositalmente, ou não, é difícil saber a verdade, mas as coincidências, muitas vezes, são o que tornam a vida especial, ou algo em si especial, porque forçar as coisas, por vezes, parece ser algo que contradiz o que queria o destino, e o resultado, infelizmente, pode ser um “Estômago 2 – O Poderoso Chef” da vida.
Acredito que boa parte da ansiedade em torno dessa continuação era o reencontro com o Raimundo Nonato de João Miguel, e ele se faz presente com seu típico humor, sua irreverência e seus dotes culinários, como era de se esperar. No entanto, Nonato parece mais um coadjuvante de sua própria história, porque o interesse de “Estômago 2 – O Poderoso Chef” está completamente voltado para o Benedetto Caroglio de Nicola Siri, que desfruta de um claro protagonismo na narrativa. O problema, porém, não é essa quebra de expectativa, mas o quão conflitante são as duas tramas diferentes que o filme se vê obrigado a explorar e desenvolver, porque são dois núcleos completamente diferentes e, apesar dessa discrepância, apresentam problemas até similares. O filme cria uma expectativa de que as histórias paralelas em algum momento, de fato, se fundam, mas elas acabam ficando bem à parte, o que enfraquece o filme no todo, que carece de uma catarse para que a junção das histórias tenham o impacto necessário no espectador. É muito supérfluo a forma como tudo ocorre, desde o desenvolvimento das histórias até o clímax onde elas, supostamente, deviam se unir. Parece quase um filme incompleto, ou então uma semente para uma eventual franquia.
O problema é que aquilo que havia de interessante no primeiro filme é quase que completamente deixado de lado em “Estômago 2 – O Poderoso Chef”, o intrigante mistério das razões que levaram Raimundo Nonato à prisão e a chocante revelação são, aqui, praticamente irrelevantes e sem qualquer peso. Isso porque o interesse de Marcos Jorge cai inteiramente sobre a trama italiana do filme com o joguete do título referenciando ao filme de Coppola. Contudo, o que encontramos são, na realidade, piscadelas constrangedoras ao filme de 1972 e o que, supostamente, seria uma homenagem, acaba tornando o filme num pastiche total, uma caricatura de qualquer senso de originalidade que havia no primeiro filme. Entra no lugar uma narrativa de máfia que, para além de maniqueísta, é extremamente genérica, como acaba sendo a contrapartida na prisão, onde o todo acaba tendo essa mesma característica. Abre-se mão da oportunidade de explorar essas figuras do nosso folclore para dar lugar a atuações canastronas como figuras saídas de um filme B de qualidade duvidosa. Tecnicamente “Estômago 2 – O Poderoso Chef” não é de todo ruim, longe disso, funciona e ligeiramente entretém através de sua montagem, mas o cerne da história, e sua embalagem -vide a trilha sonora para lá de preguiçosa, são de um produto completamente esquecível.