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Crítica | Emilia Pérez

O discurso sobre “Emilia Pérez” já está completamente contaminado, o que é uma pena, pois alguns meses atrás as expectativas eram grandes em relação ao filme que venceu o prêmio de Melhor Atriz no Festival de Cannes, sendo dividido pelas quatro atrizes que tomam conta da história. Karla Sofía Gascón representava uma oportunidade cuja afirmação veio ao se tornar a primeira mulher trans indicada ao Oscar; Zoe Saldaña tinha a demonstrar, mesmo que não precisasse provar mais nada a ninguém, que era uma atriz que ia muito além dos blockbusters; Selena Gomez teria a confirmação de ser a atriz vindoura da Disney mais bem sucedida na carreira; por fim, Adriana Paz era a ascensão global de uma atriz autenticamente latina. Não é por coincidência, portanto, que esta última tenha recebido tão pouco destaque na divulgação do filme desde Cannes, só confirmando todo esse distanciamento da latinidade que o filme de Jacques Audiard realmente possui. O que se fala é uma coisa, mas com o que se vê no filme fica o questionamento de como coisas tão gritantemente equivocadas foram não só aceitas, mas aclamadas a ponto de, por exemplo, tornar “Emilia Pérez” recordista em indicações ao Oscar.

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Mesmo deixando de lado todas as polêmicas posteriores envolvendo o filme, é impossível não notar que as várias declarações dos envolvidos na produção, a maioria xenofóbicas, refletem o que mais afeta “Emilia Pérez”, que é a superficialidade que essa história apresenta, seja em relação ao cenário latino, o idioma ou as próprias personagens, inclusive sobre identidade de gênero. Boa parte do que vemos se parece mais uma caricatura imaginada por Jacques Audiard do que, de fato, uma representação de qualquer coisa. Acredito que muito disso é porque Audiard queria realizar aqui algo que fosse considerado moderno, mas é só um cinema equivocado, quem sabe até escrachado. É uma linha tênue, como a canção “La Vaginoplastia”, que dentro do contexto maior do filme serve como uma reflexão sobre procedimentos estéticos como forma de consumismo, mas não deixa de ser de mau gosto. “Emilia Pérez” apresenta algumas poucas boas ideias, mas sua execução sempre parece pender para a pior escolha possível na hora de desenvolvê-las, até visualmente. Porque esse cinema “moderno” que Audiard tenta implementar aqui recai também sobre a linguagem que utiliza, mas a fotografia e suas escolhas de filtros e movimentos de câmera, que tentam emular o dinamismo de vídeos que hoje são populares nas redes sociais, soam como uma réplica de alguém que não compreende como funciona essa comunicação.

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E essa falha de comunicação se estende, não ironicamente, também através das atrizes, com Selena Gomez sendo o principal destaque negativo, mas Zoe Saldaña também não fica muito atrás, onde a pronúncia em espanhol de ambas parece ter saído diretamente de algum tradutor online, sendo que a própria Karla Sofía Gascón têm seus momentos em que deixa transparecer seu sotaque original espanhol. Todos esses elementos e essa superficialidade fazem do trabalho das atrizes algo que é difícil julgar, com quaisquer esforços perdidos em meio a uma mensagem confusa, cujo resultado deixa uma mensagem maior e mais verdadeira, que é sobre o que é aceito e o que realmente pensam de culturas alheias.

Emilia Pérez” – Trailer Legendado:

Emilia Pérez” (2024); Direção: Jacques Audiard; Roteiro: Jacques Audiard; Elenco: Zoe Saldaña, Karla Sofía Gascón, Selena Gomez, Adriana Paz, Mark Ivanir, Édgar Ramírez; Duração: 132 minutos; Gênero: Crime, Drama, Musical; Produção: Jacques Audiard, Pascal Caucheteux, Valérie Schermann, Anthony Vaccarello; País: França; Distribuição: Paris Filmes; Estreia no Brasil: 06 de Fevereiro de 2025;

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