“Clube dos Vândalos” (“The Bikeriders”, 2023); Direção: Jeff Nichols; Roteiro: Jeff Nichols; Elenco: Jodie Comer, Austin Butler, Tom Hardy, Michael Shannon, Mike Faist, Norman Reedus; Duração: 116 minutos; Gênero: Drama, Policial; Produção: Sarah Green, Brian Kavanaugh-Jones, Arnon Milchan; País: Estados Unidos; Distribuição: Universal Pictures; Estreia no Brasil: 20 de Junho de 2024;
Jeff Nichols é um cineasta estadunidense que apesar de não ser tão badalado quanto outros de seus contemporâneos, entrega filmes tão interessantes quanto. Sua escala de produções é relativamente menor, é verdade, com 6 longas lançados em quase duas décadas, já contando com “Clube dos Vândalos” este ano. Talvez o reconhecimento de Nichols também seja menor que o merecido por conta da tímida distribuição internacional de seus filmes, sendo o Brasil um exemplo perfeito disso, onde nem mesmo um filme do cineasta com indicação ao Oscar, “Loving”, conseguiu tração suficiente para um lançamento nos cinemas. Com seu novo filme isso muda, e pela primeira vez se aposta numa estreia em média/grande escala para uma de suas produções, com “Clube dos Vândalos”. O que também poderia significar a primeira unanimidade na carreira do cineasta, numa realização que, quem sabe, pudesse finalmente sanar todas as dúvidas que até então pairavam sobre suas realizações que, apesar de muito sólidas, sempre estavam aquém do potencial das próprias expectativas que criaram. Protagonizado por Austin Butler (“Duna: Parte 2”, “Elvis”), Jodie Comer e Tom Hardy, o filme conta através de relatos registrados por um fotógrafo, interpretado por Mike Faist (“Rivais”), o surgimento e estabelecimento de um clube de motociclistas dos Estados Unidos.
Intercalando entre os três personagens principais, mas partindo principalmente do ponto de vista de Kathy (personagem de Comer), que é quem reconta partes da história para Danny (personagem de Faist), o filme se dá entre idas e vindas no tempo, desde os primeiros anos do clube, quando Kathy conhece Benny (personagem Butler), até muitos anos depois, quando muitos dos primeiros membros do “Clube dos Vândalos” já haviam seguido seus próprios caminhos. Assim, por cerca de 15 anos acompanhamos os acontecimentos que definiram as relações desses personagens entre as décadas de 60 e 70, numa recriação artística bem apurada e inspirada, com a elegância que é de se esperar dos filmes de Jeff Nichols, além de uma seleção musical que parece nos transportar diretamente para a época, aos tempos da brilhantina e couro. Apesar dessa constante emulação de uma época que hoje remete a nostalgia, o filme é bem-sucedido em criar uma ambientação que tem sua própria identidade e que possui uma aura de realidade palpável. É o primeiro passo para o que funciona de melhor em “Clube dos Vândalos”, porque a credibilidade desse universo permite a Nichols explorar diversas facetas diferentes com seus personagens e desenvolver diversos sentimentos em relação ao que estamos vendo.
Assim, “Clube dos Vândalos” tem uma série de personagens menores que servem quase como anedotas, e são uma delícia de acompanhar mesmo que por brevíssimos momentos, mas é uma prova de como Nichols consegue estabelecer esse universo, inclusive dando espaço para seu ator favorito brilhar com uma cena só sua, com Michael Shannon estrelando um dos momentos mais tocantes do filme. Essa sensibilidade só é possível pelo que é explorado de maneira mais funcional aqui, onde se tece com maestria um discurso sobre masculinidade e sua fragilidade e essa homoafetividade que se passa por irmandade. Essa confusão de sentimentos onde homens que não sabem ser outras coisas só encontram amparo em seus iguais, mas que, obviamente, fora dali levam suas vidas normalmente, com esposa e filhos. Tudo isso é tão bem construído no filme, com um imagético de beleza singular, mas que capenga porque a outra parte não faz frente para gerar um real conflito. Se Austin Butler brilha -até mais do que na vez em que foi indicado ao Oscar-, contracenando com Tom Hardy, é porque essa dinâmica homoafetiva que Nichols explora, com figuras que anseiam umas pelas outras, é toda muito bem estruturada e desenvolvida, enquanto o romance heteronormativo entre Butler e Comer até prejudica a atriz, porque em boa parte do tempo ela pouco tem a fazer, assim como Mike Faist, sendo que os dois parecem totalmente deslocados do filme. Um romance que não tem sensualidade ou sexualidade, sem sexo, atração sexual ou até mesmo um beijo, de certa parte uma frieza de Jeff Nichols. Poderia ser um contraponto interessante, assim como o surgimento de outra vertente, mais violenta, dentro do “Clube dos Vândalos”, entretanto, são pontos que Nichols não consegue, ou não sabe como, desenvolver, acabando como oportunidades desperdiçadas que fazem com que o filme penda para um lado só e sucumba, mais uma vez, às expectativas que cria por si só.