Animais Fantásticos: Os Crimes de Grindewald (Fantastic Beasts and the Crimes of Grindewald, 2018); Direção: David Yates; Roteiro: J.K. Rowling; Elenco: Eddie Redmayne, Katherine Waterston, Dan Fogler, Alison Sudol, Ezra Miller, Zoë Kravitz, Callum Turner, Claudia Kim, William Nadylam, Kevin Guthrie, Jude Law, Johnny Depp; Duração: 134 minutos; Gênero: Aventura, Drama, Fantasia; Produção: David Heyman, J. K. Rowling, Steve Kloves, Lionel Wigram; País: Estados Unidos, Reino Unido; Distribuição: Warner Bros. Pictures; Estreia no Brasil: 15 de Novembro de 2018;
Uma das falas que mais acometeu “Animais Fantásticos e Onde Habitam” foi a afirmação de J.K. Rowling de que a nova franquia consistiria, ao de invés de uma trilogia, em cinco filmes. Os efeitos de lançar algo tão ambicioso se faziam pesar no primeiro filme, que tinha uma obrigação que o impedia de desenvolver uma história mais centralizada e mais focada em seus protagonistas, onde certas tramas, principalmente das relações entre os mesmos, ficavam devendo. Sendo que, com uma dramaticidade consequentemente superficial, restava ao final um evento sem ares tão grandiosos e anticlimático por seu viés propositalmente inconclusivo, que preparava para esta sequência.
“Animais Fantásticos: Os Crimes de Grindewald” chega aproximadamente dois anos após o lançamento de seu antecessor, com uma expectativa relativamente alta por prometer apresentar um dos mais importantes personagens de Harry Potter, mas que acaba aqui comedido a um papel coadjuvante pequeno e que, ainda que tenha sua relevância -principalmente explicitando o que representa- serve apenas como uma introdução, assim como outros elementos do filme, onde J.K. Rowling e David Yates parecem se recusar a aprender com erros anteriores e insistem em uma obra que é, outra vez, refém da promessa de uma franquia e igualmente inconclusiva.
Contudo, no primeiro filme havia ainda alguma diversão com o senso de aventura clássico implementado pelo deslumbramento constante inferido pelos animais fantásticos do título. Mesmo com suas limitações como diretor, David Yates conseguia conduzir boas sequências, entretanto, aqui nem isso é capaz de realizar. Em parte, porque o deslumbramento com as figuras pelas quais o protagonista tanto apreço tem são limitadas a uma mínima participação possível, sendo que boa parte da atenção é lhes dada uma sequência bem para o início do filme, de forma completamente irrelevante à narrativa e sem qualquer peso dramático; o famoso fan service, usado aqui para justificar a primeira parte do título de “Animais Fantásticos: Os Crimes de Grindewald”.
O foco recaí, portanto, sobre o novo subtítulo. Os crimes do antagonista que movem figuras conhecidas e novas a um embate pela manutenção da paz entre o mundo bruxo e dos humanos. Assim, são diferentes subtramas que permeiam a narrativa enquanto tentam conduzir para um evento cataclísmico que servirá de clímax quando estas subtramas se cruzarem. Todavia, o caminho é cheio dos percalços num roteiro, escrito apenas pela própria J.K. Rowling, que se mostra abarrotado demais. A consequência é uma história que nunca firma seus pés em algum quesito e que se apresenta de maneira demasiadamente burocrática e extremamente didática.
Chega a ser revoltante, por exemplo, como um MacGuffin é apresentado explicitamente, tem sua origem explorada clara e compreensivelmente em uma cena específica tudo para, logo na cena seguinte, em uma outra trama paralela, se ter a necessidade de inserir um termo didático para mastigar de todas as formas possíveis o que se acabou de ver. Yates, por sua vez, não é nada sutil também, e o filme é recheado de seus planos detalhes que tem a função de explicitar praticamente tudo o que ocorre, algumas vezes até se fazendo soar deslocados e embaraçosos, como um pelúcio vagando por uma reunião de bruxos.
Já no roteiro de Rowling, certos elementos parecem um retrocesso em relação ao que havia funcionado de melhor no primeiro filme. A relação entre Kowalski (Dan Fogler) e Queenie (Alison Sudol) sofre um tamanho desserviço e se torna constrangedora; o primeiro deixa de funcionar como alívio cômico, e sua participação é tão irrelevante que parece até ser esquecido que é preciso dar algo ao personagem para fazer; já Queenie é a maior vítima disso tudo, além de ter uma trama bastante desconexa de todo restante, suas motivações fazem a personagem passar por um processo de “imbecilização” que é estarrecedor e frustrante depois de tudo que foi visto. Enquanto Newt (Eddie Redmayne) e Tina (Katherine Waterston) também veem seu romance reduzido, enquanto novos elementos, ou personagens, são adicionados a isso, gerando uma espécie de quadrado amoroso.
Contudo, quem recebe uma dose especial de atenção é a Leta Lestrange de Zoë Kravitz (“Big Little Lies”), atriz que tem aqui, talvez, o papel de maior destaque em sua carreira. E é evidente o seu crescimento como atriz, contornando todo o pedantismo e desleixo presente no roteiro de J.K. Rowling, se sobressaindo ao que está ali pela intensidade a qual imprime à sua personagem. Supostamente o efeito catártico de sua trama devia ser o mais efetivo, contudo, falha porque há um problema estabelecer e sustentar com força as relações no filme, com J.K. Rowling criando seus próprios deméritos.
Assim como faz ao insistir em Johnny Depp, que culmina aqui numa atuação sem vida, onde o ator parece estar se contendo o máximo possível para que, em nenhum excesso, faça o desfavor de desagradar ao público. Mesmo assim, segue sendo o mesmo ator caricato dos últimos tempos, só denotando como foi um desperdício ter deixado Colin Farrell para trás no primeiro filme. Há ainda a impressão de que haviam mais cenas do ator no filme, mas que foram retiradas na edição. Há também a tentativa de criar uma certa dubiedade sobre as motivações do personagem, de maneira a não o tornar apenas maniqueísta, algo no qual o roteiro fica longe de obter qualquer sucesso.
“Animais Fantásticos: Os Crimes de Grindewald”, na insegurança de tomar lados, se torna, portanto, um filme sem bases nas quais se sustentar. Quer dar conta de todos os lados, mas não investe em nenhum de maneira consciente e competente, deixando a história não com um gosto de quero mais, e sim com um gosto amargo de uma promessa quebrada, onde outra vez mais é entregue um filme intermediário e transitivo, que consegue ser anticlimático ao fazer com que sua narrativa não pareça andar em frente, e de fato pouco o faz. Assim, tentando recorrer a reviravoltas mirabolantes na esperança de sustentar o interesse do espectador pelos próximos dois anos de espera até o lançamento de um eventual terceiro filme.
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