Mais uma temporada de Clássicos exibidas pelas redes Cinemark, uma grande oportunidade para descobrir ou redescobrir um pouco mais dos grandes sucessos do cinema, sobretudo aos que fogem à sua zona de conforto. O primeiro longa dessa temporada a ser exibido é o ganhador do Oscar de melhor filme, O Silêncio dos Inocentes, de 1991, contando com a direção de Jonathan Demme, também laureado com uma estatueta. Há muitas qualidades destacáveis que justifiquem a obra ser tão aclamada, é um suspense como pouco se fez posteriormente contudo o mais chamativo, sem a menor dúvida, é o embate de dois personagens antíteses entre si, complementares, gerando um êxtase por parte do público no duelo verbal entre os dois.
Clarice Starling (Jodie Foster) é uma jovem detetive que tenta encontrar o paradeiro de um nefasto serial killer que, por motivos obscuros, ataca apenas mulheres. Para atingir êxito, a detetive pede auxílio ao dr. Hannibal Lecter (Anthony Hopkins), um psicólogo de alto intelecto, porém que é canibal e consequentemente letal para o convívio social, ele aceita se aliar a jovem mais por curiosidade e fascínio a figura da mulher do que as regalias que eventualmente poderia receber. Desde o início, a relação dos dois é uma embate entre diferentes gênios e interesses, na qual ele se sai com vantagem por conseguir domar a situação a seu favor, aos poucos ambos Clarice vai se entregando e percebe que o maior problema está dentro dela, tendo a chave para a resolução do mistério. Eis que é preciso enfrentar os gritos dos cordeiros, ou seja, os próprios demônios internalizados da detetive.
O ponto mais marcante de O Silêncio dos Inocentes é seu roteiro, pautada na construção de um embate psicológico entre seus personagens principais, usando do suspense como elemento principal, proporcionando uma grande carga de tensão e sufocamento ao público. Clarice representa a inocência, pureza e bondade, ou metaforicamente o “cordeiro” que grita, esperneia, quando olha para a realidade cruel da sociedade, antagonicamente Hannibal representa o oposto, a perversidade fisiológica, o anseio em estar um passo à frente e sua auto-suficiência. O que une os dois, no entanto, é justamente a necessidade de complemento que um busca no outro, pois o fascínio que a agente adquire ao psicopata se torna recíproco a medida que ele a vê como uma figura para além do simplório. A direção de Demme é eficiente em transpor toda a carga pesada e horripilante, tornando uma experiência de grandes calafrios, é algo muito bem feito no que diz respeito ao gênero por conseguir mexer com os medos do público, abordando o mais banal e tornando algo extremamente tenso, pesado, algo à época bastante revolucionária. Anthony Hopkins, que ganhou o Oscar de melhor ator por esse papel, tem 16 minutos onde ele eclipsa tudo e todos, não há comparações para sua performance singular, conseguindo personificar a frieza, o fascínio e a intelectualidade de um figura tão vasta. Já Jodie Foster, também vencedora do prêmio, mesmo tendo um bom desempenho, fica aquém de louvações, sobretudo por ter um parceiro de cena tão soberbo e hipnotizante.
Entre tantas características a se classificar este longa, a principal talvez seja instigante: o público entra na trama, se fascina com seus personagens, fica eufórico na cadeira até seu desfecho. Sua finalização pode dividir opiniões, mas não a ponto de desvalorizar a grande experiência que é O Silêncio dos Inocentes, um filme capaz de levar a reflexão sobre o enfrentamento com nossos próprios demônios, ou os “cordeiros”. Afinal, é melhor ouvi-los gritar ou seu silêncio? Fica a questão.