O processo de popularização dos “Guardiões da Galáxia”, uma equipe relativamente desconhecida dos quadrinhos, é quase inteiramente devido ao trabalho de James Gunn, que entrincheirou as figuras daquele grupo na cultura popular em uma das maiores surpresas do gênero 11 anos atrás -o tempo voa! Seu trabalho nos dois primeiros filmes o chancelou em outro estúdio, quando ele teve a liberdade de reimaginar um filme decepcionante da DC reutilizando alguns personagens em “O Esquadrão Suicida”, filme que abriu as portas para que ele se tornasse o responsável por todo o estúdio após sucessivos fracassos de crítica e público. Como não é bobo nem nada, ele tomou logo para si a cereja do bolo, pois se Gunn de alguma forma influenciou na cultura popular contemporânea, é certo que dizer que o gênero que o alçou para o mundo tem como uma das suas principais influências o filme de Richard Donner. Desde 1978 muito do que foi feito em “Superman: O Filme” dita as regras para um filme de super-heróis ideal ao público, e a própria Marvel com Kevin Feige bebeu mais nessa fonte do que a DC nas últimas décadas, que foi guiada mais pelo que Christopher Nolan (“Oppenheimer”) fez com Batman, e depois se esvaiu em meio aos esteroides de Zack Snyder (“Batman v Superman”). Assim, James Gunn toma as rédeas da DC com “Superman”, que tenta resgatar o tom e as características que tornaram o filme de 78 tão popular, enquanto mescla com o que acredita ser a chave de seu sucesso.

Sai de cena aquela sisudez e melancolia que imperou desde “O Homem de Aço” e entra em ação uma leveza que é bastante característica de seu realizador, inclusive com uma pitada de sarcasmo em relação a violência e elementos escatológicos, mesmo que sutis, marcas autorais que James Gunn repete aqui, assim como outras ideias que já vimos em seus filmes anteriores. Originalidade com certeza não é uma palavra que existe aqui, e até é difícil exigir isso, o desgaste é inevitável, e sabendo disso ao menos se evita a repetição de histórias de origem, de primeiros encontros e outras coisas desnecessárias às quais já estamos familiarizados dada tamanha popularidade do personagem protagonista. Se isso não é exibido, no entanto, muito é falado, porque se há algo que “Superman” faz questão de ser, é verborrágico, e regurgita informações da maneira mais didática possível. O Senhor Incrível de Edi Gathegi é praticamente um dicionário ambulante e especialmente em sua principal sequência de ação é também uma réplica de outro personagem de outro filme de James Gunn (lembra algo?). Essa dificuldade em criar algo novo e a necessidade de replicar muitas coisas também influencia o filme em diversos outros momentos, alguns como referências diretas claras, outros por pura limitação imaginativa.

Em uma das suas principais sequências de ação é bem possível que você se pergunte o que diabos “Superman” está fazendo num mundo Minecraft, enquanto James Gunn também tem dificuldade para encontrar um vilão à altura de um embate com o protagonista, e aqui é a questão da força, e não é algo específico de Gunn, porque Snyder também teve esse problema e foi muito criticado por seu prazer em destruir cidades com seus anseios por grandiloquência. Aqui isso é diferente, porque se quer priorizar algo menor, mas há esse dilema, mesmo que o Super-homem de David Corenswet (“Twisters”) apanhe até mais do que se imaginaria capaz para o ser mais forte do mundo. James Gunn quer uma figura mais vulnerável também para mostrar que os tempos mudaram, que super-heróis podem também serem humanos, e isso gera uma das melhores cenas do filme, muito por conta da atuação de Nicholas Hoult (“Nosferatu”) em surto como Lex Luthor -que também se faz assombroso em sua psicopatia algumas cenas antes. Mas ainda há o dilema de um grandioso embate e a solução que se encontra para isso chega a ser até preguiçosa e, talvez, até equivocada para um primeiro filme numa possível franquia.

E isso acontece porque “Superman” tem dificuldade de equilibrar tantos núcleos de personagens em suas pouco mais de duas horas, quer atirar para todos os lados, mas com isso tira tempo que beneficiaria alguns personagens mais interessantes, dando tempo a outros que mesmo que façam parte de toda a caricatura que James Gunn quer construir, acabam sendo um excesso também desnecessário. Isso prejudica uma das tramas mais importantes do filme, que é claramente uma alusão ao genocídio palestino conduzido por Israel, porque a resolução ali, apesar de significativa, é até um pouco abaixo das expectativas que se estabelecem durante o filme. E não é algo particular dessa trama, para o que Hoult entrega com seu Lex Luthor, apesar de sua grande sequência de atuação, sua resolução também deixa um pouco a desejar (e também lembra algo?), assim como toda a trama envolvendo o Planeta Diário, que parece mais um excesso, ainda que Rachel Brosnahan (“Operação Vingança”) mostre todo seu talento cômico quando é necessário, com um timing que deixa saudades dos seus melhores momentos em “The Marvelous Mrs. Maisel” e é uma rara exceção ao terrível tratamento que o roteiro dá a qualquer personagem feminina no filme.
Por fim, “Superman” pode ser considerado um filme inofensivo, com diversas fragilidades, excessos e falhas, afinal errar é humano, não é mesmo? Como Corenswet sabe fazer cara de bom moço, mesmo sendo engolido em cena quando contracenando com atores melhores que ele, o tom ameno e simpático vai conquistar o público, mas um olhar cuidadoso sabe que ainda falta muito chão para se tornar algo sequer próximo do super-herói que tanta força tem na cultura popular.
“Superman” – Trailer Legendado:
“Superman” (2025); Direção: James Gunn; Roteiro: James Gunn; Elenco: David Corenswet, Rachel Brosnahan, Nicholas Hoult, Edi Gathegi, Anthony Carrigan, Nathan Fillion, Isabela Merced; Duração: 129 minutos; Gênero: Ação, Fantasia; Produção: Peter Safran, James Gunn; País: Estados Unidos; Distribuição: Warner Bros. Pictures; Estreia no Brasil: 10 de Julho de 2025;