“Uncharted – Fora do Mapa” (“Uncharted”, 2022); Direção: Ruben Fleischer; Roteiro: Rafe Lee Judkins e Art Marcum & Matt Holloway; Elenco: Tom Holland, Mark Wahlberg, Sophia Ali, Tati Gabrielle, Antonio Banderas; Duração: 116 minutos; Gênero: Ação, Aventura, Comédia; Produção: Charles Roven, Avi Arad, Alex Gartner, Ari Arad; País: Estados Unidos; Distribuição: Sony Pictures; Estreia no Brasil: 16 de Fevereiro de 2022;
Há muito se ouve das tentativas de adaptar “Uncharted” para os cinemas. Uma das franquias originais e exclusiva mais bem sucedidas da Sony no Playstation. O filme teve um processo de desenvolvimento conturbado, engatando e perdendo nomes um atrás do outro, até que certo dia as coisas foram para frente com Tom Holland e Mark Wahlberg escalados como protagonistas e Ruben Fleischer como diretor. Três nomes muito bem sucedidos, à sua maneira. Se apresentou, portanto, a receita aparentemente perfeita e simples do sucesso para a Sony. O resultado que encontramos a partir dessa semana nos cinemas parece traduzir o sentimento que envolve a produção depois de tanto tempo sem ir para frente e sem conseguir ser realizada: vamos terminar logo com isso de uma vez por todas. E assim, realmente os três nomes que citei e encabeçam a produção trazem a maior simplicidade possível de seus trabalhos mais conhecidos para tentar recriar algo similar ao visto em que fizeram em outros filmes, esperando repetir, também, o subsequente sucesso que obtiveram em outras produções. “Uncharted – Fora do Mapa” pode até se mostrar bem sucedido com o público, descobriremos em breve. Mas a verdade é que se não o fizer, não surpreenderá.
Video Games e cinema hoje são mídias tão diferentes e autossuficientes que primeiro não acho nem justo compará-las, são experiências completamente únicas e com suas especificidades. Portanto, também acho irrelevante taxar como “mais outra adaptação ruim de um jogo”. Pode até vir ao caso, mas a verdade é que pouco importa esse rótulo, pois o que se busca ao experienciar ambas as coisas são universos quase paralelos, ainda que a indústria de jogos tenha assumido com orgulhos “narrativas cinematográficas”. É o cinema, portanto, quem parece brigar com essa sina solitariamente. Talvez até porque a fixação em adaptar, de fato, um jogo se dê de maneira que é pensada uma forma de emular a experiência de outra mídia. Algo que ocorre aqui e, assim, como filme, “Uncharted – Fora do Mapa” sela seu destino como um fracasso desde sua concepção. Como experiência cinematográfica é um desastre, por mais que narrativamente seja coerente num todo, o simples aqui nunca é capaz de empolgar por conta de uma miríade de escolhas que deixam o filme sem qualquer brilho. Os mistérios não funcionam, as relações emocionais não funcionam e os personagens em nada são atrativos, mesmo tendo uma base completa já pronta para se inspirar no desenvolvimento dos mesmos.
Até porque inspiração é uma palavra que dificilmente encontramos quando se pensa qualquer aspecto de “Uncharted – Fora do Mapa”. Obviamente não ajuda uma nova adaptação de “Tomb Raider” ter sido lançada em 2018, ainda que duvido que muita gente se lembre do filme estrelado por Alicia Vikander. A efeito de comparação, algo que o filme de Ruben Fleischer podia ter tirado dali era inspiração para sair do lugar comum, lugar esse que foi via de regra também no filme da Warner 4 anos atrás. Porque o que encontramos aqui é algo completamente genérico e chapado. Desde as cores à fotografia, tudo é padronizado e o mais sem graça possível, pasteurizado e padronizado, refém de um mesmo processo de industrialização dos filmes que alçaram Tom Holland ao sucesso absoluto que tem hoje. Não há qualquer traço de identidade ou personalidade, que diferencie ou destaque o filme em relação a qualquer coisa que já vimos antes. A maioria das sequências de ação, inclusive, é reduzida a resoluções digitais que imprimem a vontade de apenas despejar nos cinemas uma marca ilustrada por um rosto famoso. Não há qualquer traço de vida que possa ser encontrado no filme em termos de execução.
Tom Holland, inclusive, a princípio até parece tentar entregar algo. Contudo, é tanta indiferença no conteúdo que até o ator parece desistir no meio do caminho. E os personagens são tão pobremente desenvolvidos que se tornam desinteressantes. No fim, a maioria é uma tentativa de colagem de alívios cômicos os mais batidos possíveis, para que se tenha uma reação de qualquer espectador em potencial. É preciso se tornar comercial a qualquer custo. E o custo, aqui, é o filme todo. É engraçado como até o abdômen definido do protagonista é “vendido” ao público sempre que possível, todavia, mesmo com um possível interesse romântico, com quem se divide uma cama, toda e qualquer sexualidade ou sensualidade em “Uncharted – Fora do Mapa” é impedida de existir. Com todo esse puritanismo, a produção comandada por Ruben Fleischer não passa disso: um filme estéril. E não é só pela privação de qualquer luxúria, mas da própria vida em si. Uma aventura que não corre riscos, pelo contrário, se esconde nas soluções mais fáceis. Se há algum carisma em um ou outro momento, é puramente pelos protagonistas, que mal saem de suas zonas de conforto. O resultado é um filme que não pulsa, pois como os vilões que Drake enfrenta, não tem sangue algum nas veias.