Crítica | Um Estado de Liberdade

Título Original:  Free State of Jones

Direção: Gary Ross

Roteiro: Gary Ross

Elenco: Matthew McConaughey, Gugu Mbatha-Raw, Mahershala Ali, Keri Russell

Produção: Jon Kilik, Gary Ross, Scott Stuber,

Estreia no Brasil: 17 de Novembro de 2016

Duração: 139 minutos

Gênero: Ação/Drama

Classificação Indicativa: não recomendado para menores de catorze anos

É incrível como coincidências podem ser tão pertinentes – ou até mesmo irônicas. Ainda mais se levarmos em conta o momento em que vivemos, comparando-se aos acontecimentos de Um Estado de Liberdade, por exemplo. De fato, não estamos em uma batalha armada e sangrenta como a Guerra de Secessão, mas é no mínimo curioso que ainda no século XXI alguns temas centrais da fita ainda permaneçam em pauta. O preconceito, passando pela intolerância religiosa, até mesmo os questionamentos da necessidade de obrigar civis a ir para um exército são questões que, geração após geração, simplesmente não somem. Um Estado de Liberdade está aí justamente para nos lembrar que, embora tenhamos avançado (e muito) na conquista de direitos sociais, a humanidade está muito longe de ser humana.

Inspirado em eventos reais, acompanhamos Newton Knight (Matthew McConaughey) um fazendeiro que, convocado para guerra, decide que não vai lutar por algo que não concorda, uma vez que é contra a escravidão e a secessão. Assim, junto com outros camponeses, escravos fugitivos e simpatizantes, ele cria um estado livre, em que não há distinção de gênero ou etnia, todos são iguais formalmente. Com o passar do tempo, o condado é visto como uma ameaça ao pensamento majoritário da época, passando, então, a sofrer represálias e pressões de grupos extremistas como o Ku Klux Klan e os próprios confederados.

Após iniciar a estrondosa franquia Jogos Vorazes, o diretor Gary Ross, mais uma vez, nos apresenta um filme de resistência e luta por ideais, porém, ao mesmo tempo, melancólico e, de certa forma, desesperançoso. Ross, ainda que em diversos momentos apele para sua câmera em movimento sem a menor necessidade, sabe abordar a guerra com a sensibilidade que poucos diretores atingem. Ele entende que toda situação é triste: não há necessidade de todas essas vidas serem perdidas, ainda mais quando quem está no campo de batalha não é porque defende um lado ou outro, mas, sim, apenas porque foi obrigado. Ademais, é interessante notar as camadas que Ross coloca nos personagens, especialmente porque, neste gênero, é muito fácil ceder a maniqueísmos.

Nesse sentido, as atuações também se mostram muito relevantes. Matthew McConaughey, mais um vez, leva o filme nas costas, sem nunca deixar de dar espaço para outros se destacarem, como, por exemplo, a Gugu Mbatha-Raw a qual poderia passar desapercebida no papel de esposa de Newton, contudo percebe-se, conforme a narrativa vai se desenvolvendo, a força tanto da atriz quanto da personagem. Também merece uma menção honrosa o ator Mahershala Ali pelo seu personagem Moses Washington que também tem uma trama interessantíssima, ainda que seu personagem seja ficcional.

Por fim, Um Estado de Liberdade é um filme de guerra que não se rende ao espetáculo, tendo em vista que está muito mais interessado em falar de política do que de morte e de sangue. Em suas quase duas horas e meia de projeção (as quais você nem sente), Gary Ross e sua equipe nos forçam a refletir, com o passado, o presente, e não é a toa que iniciei o texto falando das coincidências pertinentes, pois se naquela época buscavam-se mais direitos, hoje tenta-se caçar estes. E isso é um fenômeno mundial que pode começar com um golpe institucional, com a eleição de um empresário manifestamente machista, elitista e homofóbico… Enfim, talvez seja interessante olhar um pouco para trás para se ter certeza de que não é tirando direitos e garantias que se resolve uma crise.

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