O Relatório (The Report, 2019); Direção: Scott Z. Burns; Roteiro: Scott Z. Burns; Elenco: Adam Driver, Annette Bening, Jon Hamm, Ted Levine, Michael C. Hall, Tim Blake Nelson, Corey Stoll, Maura Tierney; Duração: 119 minutos; Gênero: Drama, Thriller; Produção: Steven Soderbergh, Jennifer Fox, Scott Z. Burns, Kerry Orent, Michael Sugar, Eddy Moretti, Danny Gaba; País: Estados Unidos; Distribuição: Diamond Films; Estreia no Brasil: 07 de Novembro de 2019;
O subgênero “baseado em fatos reais” instiga o público pelo fato óbvio da curiosidade geral dos fatos dos bastidores que aconteceram de casos notórios. A principal problemática, entretanto, é a fidelidade. Grandes romantizações acabam por estragar a experiência pela falta de veracidade. O diretor Scott. Z. Burns aborda em seu filme, “O Relatório“, um caso polêmico no imaginário americano: a prática dos usos mais variados de tortura a fim de conseguir informações sobre terrorismos, após o 11 de setembro. O buraco é ainda mais embaixo quando se assume uma informação controversa: O governo americano, liderado pelo republicano George W. Bush, tinha informação da possibilidade de atentados terroristas em território americano bem antes da queda das torres gêmeas. Essa “culpa” é o fio condutor que leva a CIA a usar de todos os métodos possíveis para conseguir informações a fim de coibir eventuais futuros atos.
A investigação de tais atos de tortura ocorreu ao longo de 5 anos, sob liderança de uma senadora democrata (Annete Benning). Um funcionário seu, Dan Jones (Adam Driver), viveu exclusivamente em função disso, ao longo destes anos, lendo documentos da CIA, do FBI e da própria Casa Branca – com autorização regimental para tal. Em dado momento, se depara que as práticas “aperfeiçoadas”, tão respaldadas como técnicas psicológicas para induzir o preso a falar a verdade, faziam uso do afogamento, o falso enterramento, e das mais nocivas humilhações possíveis. O governo do democrata Obama é eleito, proíbe tais práticas, porém, em meio as investigações, consegue encontrar Osama Bin Laden, garantindo sua reeleição, empacando ainda mais a publicação do tal relatório, decorrente da burocratização das informações.
É um fato consumado o uso da tortura, pelos americanos, em inúmeros casos durante sua história. Sempre foi e sempre será. O diretor e roteirista Scott Z. Burns assume, contudo, a dificuldade das instituições e seus representantes em aceitarem tal fato. Não só negligenciam isso, como tentam se esquivar, achando uma justificativa para validar práticas hediondas. A burocratização do Estado é generalizada, qualquer movimento por qual um analista como Dan Jones faz, é considerado facilmente crime de Estado, traição, não por acaso a revolta de tamanho cinismo causa movimentos similares ao de Edward Snowden. Tentar expor a hipocrisia no discurso de liberdade e democracia encarnado em meio a burocracia americana.
Adam Driver (“Infiltrado na Klan“) é um dos atores mais interessantes dos últimos anos. Tamanha sutileza a construção de seu Dan Jones, aonde vemos um burocrata em plena ebulição, sentimos seu conflito, desejamos inclusive sua traição. Porém um burocrata sempre burocrata. É interessante perceber o quanto o ufanismo americano consegue estar na alma do cidadão, por mais adversa seja a situação. Annete Benning, uma das atrizes mais injustiçadas da história do cinema americano, vai a luta por seu Oscar. Apesar de ter um papel de coadjuvante, apresenta momentos aonde mostra grande fôlego e desenvoltura. Uma indicação, ao menos, seria válida.
“O Relatório” pode até pesar por ser um tanto convencional, ou mesmo por ser uma temática ao qual estamos cansados de ver, ouvir, ler e falar. Deve funcionar mais para os americanos, que precisam, mais do que nunca, olhar para o retrovisor e se deparar consigo mesmo. Conosco, rende um filme interessante.
“O Relatório” – Trailer Oficial:
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