Crítica | Dear White People | 1ª Temporada

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Dear White People (1ª Temporada) (Netflix, 2017-); Criada por: Justin Simien; Direção: Justin Simien, Tina Mabry, Barry Jenkins, Steven Tsuchida, Nisha Ganatra, Charlie McDowell; Roteiro: Justin Simien, Chuck Hayward, Njeri Brown, Jack Moore, Leann Bowen, Nastaran Dibai; Elenco: Logan Browning, Brandon P. Bell, DeRon Horton, Antoinette Robertson, Marque Richardson, John Patrick Amedori, Ashley Blaine Featherson, Obba Babatundé; Número de Episódios: 10 episódios; Data de Lançamento: 28 de Abril de 2017;

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(Divulgação: Adam Rose/Netflix)

O texto contém spoilers.

Com a conscientização cada vez mais crescente, bem como o inverso, de situações sociais alheias, em grande maioria das vezes pela potencialização através de plataformas que, aos poucos, abrem espaço para minorias onde antes se dizia não haver, as tensões raciais e étnicas eclodem com maior frequência, como diversos casos recentes nos Estados Unidos, onde racismo é um problema cuja raízes parecem estar longe de serem tocadas, numa sistemática que mescla as razões por trás de crimes e injustiças, vide a observação feita no excelente documentário A 13ª Emenda (13th), dirigido por Ava DuVernay e concorrente do Oscar na sua respectiva categoria este ano. Porém, se em meros cliques em uma notícia qualquer compartilhada na internet se pode ver uma repercussão com exclamações odiosas e ignorantes, de pessoas vivendo em suas bolhas, quem dirá no que retrata Dear White People, série da Netflix e espécie de reboot ao filme homônimo de 2014, do diretor e roteirista Justin Simien, que retorna aqui como criador e showrunner. Aliás, só a repercussão da divulgação da série em redes sociais já dá uma prova dessas tensões que temos de encarar, rendendo inclusive um embasado desabafo de Justin Simien, no qual a polêmica em torno da série se torna ainda mais insensata e que justifica a existência do que vemos na produção, bem como a necessidade de um debate.

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(Divulgação: Adam Rose/Netflix)

Aos que assistiram ao filme previamente, há a certeza de que não se terá receios de tocar numa temática que para muitos requer delicadeza. Há diferenças, é verdade, afinal na produção original havia uma certa correria em alguns quesitos da narrativa, bem como um final agridoce que, se por um lado acabava bem, por outro abordava o privilégio branco e abastado, ainda que o fizesse de forma rasa e figurasse mais num segundo plano, dando mais atenção à personagem de Tessa Thompson (Selma, Creed, Westworld). A própria atriz sendo na série uma das maiores diferenças, justamente por não estar presente. Não que Logan Browning faça um trabalho ruim, longe disso, a nova intérprete de Samantha White faz um trabalho na média, mas inferior ao que a ascendente protagonista do filme foi capaz com seu talento. Ainda que sejam duas obras diferentes, há momentos em que conversam entre si, bem como há coisas do filme que se beneficiam de uma exploração mais aprofundada, como o inverso também acontece. A própria Samantha White da série se vê mais diluída em meio ao espaço dado a outros personagens. Contudo, com a manutenção de alguns nomes do elenco, algo parece ficar evidente nos quatro primeiros episódios, especialmente nos dois iniciais, estes dirigidos por Justin Simien.

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(Divulgação: Adam Rose/Netflix)

Até o quarto episódio a impressão que se tem é de que, em muitos momentos, a série Dear White People se encontra repreendida ao tentar emular acontecimentos do filme Dear White People. Paira um pouco de incerteza sobre três pontos centrais transportados da trama do filme, que são a festa e os personagens de Logan Browning e DeRon Horton, o Lionel. Até os saltos temporais, as idas e vindas antes, durante e após os acontecimentos da festa, são aqui mais dispersos e fazem menos sentido do que na obra original. Eis que chega o quinto episódio e, com ele, a direção de Barry Jenkins, do vencedor de Melhor Roteiro Adaptado e cuja Moonlight – Sob a Luz do Luar venceu como Melhor Filme no Oscar este ano. Muito dos méritos, porém, merecem ser direcionados aos roteiristas, pois Chuck Hayward e Jack Moore tem colaboração fundamental aqui, assim como no nono episódio. A construção deste episódio parece uma calmaria antes da tempestade, e a forma como se dá num crescente, com a tensão se colocando não como um objetivo gratuito de chocar, mas nos lançando sobre uma realidade da qual, ainda que alguns possam estar acostumados a presenciar, não deve se fazer comum a uma grande maioria. É a partir desse episódio que a série encontra sua faceta.

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(Divulgação: Adam Rose/Netflix)

Não à toa parece haver um reinício, com alguns personagens que já tinham episódios dedicados a si recebendo mais outro. A qualidade do quinto episódio, porém, só é reencontrada nos episódios sete e nove, ambos dirigidos por Nisha Ganatra, que já demonstrou sua competência em Better Things. Ambos os episódios que ela dirige são focados em personagens controversos, um por se tratar de colocar como central um homem branco, outro por ser a personagem que mais se beneficia do novo formato. A Coco de Antoinette Robertson não somente torna-se mais complexa, e é melhor desenvolvida, com um crescimento dramático invejável a alguns outros personagens, onde até a atuação da própria atriz acaba sendo um trabalho superior ao que se tinha no filme. Quanto ao episódio entorno de Gabe (John Patrick Amedori), há um equilibro tão sensato sobre a situação que, evitando colocá-lo no papel de vítima, somos levados a compreender, talvez principalmente a parte do público que não faz parte das minorias, que certas atitudes, por mais ingênuas que se façam, não surtem o mesmo efeito a todos, ainda mais quando se vai de encontro a uma problemática que diz muito sobre o ponto em que iniciei a crítica, quando o racismo se vê encravado no cerne da sociedade.

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(Divulgação: Adam Rose/Netflix)

Justin Simien é um nome para se acompanhar de perto, o estilo de sua linguagem, do qual já se via o desprendimento de padrões no filme, aqui continua a fluir e até de maneira mais confortável e aparentemente mais calma, segura. Falta ainda um pouco de amadurecimento, especialmente quando os principais créditos do episódio final vão para o diretor e roteirista, pois falta uma mesma urgência imprimida no quinto episódio na tentativa de recriar um momento semelhante quando Troy (Brandon P. Bell) é rendido com excesso de força e seu pai (Obba Babatundé), o reitor, vem a seu socorro. Um passo além neste momento faria toda a diferença para a continuidade da série. Contudo, não é nada que estrague o que se vê durante toda a temporada, onde encontramos um recorte social de uma realidade que desagradavelmente se faz valer. Porém, vozes como as vistas em Dear White People vem ganhando espaço e ampliando essas oportunidades que desde sempre deviam existir. Há um bom humor na sátira realizada pela série que disfarça o peso da temática, que por momentos escapa do controle e se torna forte demais para se amenizar, como por outros não há necessidade alguma em se fazê-lo, construindo, assim, uma das séries mais relevantes desta década.

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