Rebecca – A Mulher Inesquecível (“Rebecca“, 2020); Direção: Ben Wheatley; Roteiro: Jane Goldman, Joe Shrapnel, Anna Waterhouse; Elenco: Lily James, Armie Hammer, Ann Dowd, Kristin Scott Thomas; Duração: 121 minutos; Gênero: Drama, Romance, Suspense; Produção: Tim Bevan Eric Fellner Nira Park; País: Reino Unido; Distribuição: Netflix; Estreia no Brasil: 21 de Outubro de 2020;
O romance Rebecca, escrito pela escritora britânica Daphne Du Maurier, foi um marco literário lançado no fim dos anos 30. Ao contar a estória de uma mulher inexperiente, apaixonada por um viúvo rico e renomado, ambos acabam se casando e indo morar em sua imponente mansão. Entretanto, as memórias da primeira esposa – a tal Rebecca – estão por toda a parte, assombrando a jovem que se vê refém de um fantasma nunca visto.
Interessante do romance, adaptado posteriormente pelo mestre do suspense Alfred Hitchcock – contando com Laurence Olivier e Joan Fontaine no elenco – é o fato da personagem título não ser a protagonista, de fato. Porém, ainda assim habitar a todo momento na estória, sendo uma figura primordial nos desdobramentos. 80 anos depois da primeira adaptação (laureada com o Oscar de melhor filme), chega a segunda adaptação literal do romance, pelas mãos do diretor Ben Wheatley, conhecido por filmes como “Topo do Poder” (2015).
Quando os elementos mais chamativos de um filme ao término de uma projeção são elementos da direção de arte exorbitante, da mansão aonde grande parte da projeção ocorre ou mesmo os figurinos belos e com preciosismo histórico inegável, significa que a obra, como um todo, carece de essência própria. Não sou adepto ao purismo de achar que uma mesma obra não é passível para diferentes adaptações, visto a particularidade da visão que cada cineasta dá ao projeto. Obviamente, por readaptar um romance originalmente adaptado pelas mãos de um nome como Hitchcock, é de ficar com receio.
Principal problema de Ben Wheatley é fazer uma adaptação literal. Ao introduzir um tom realista, anula a ambiguidade da estória original. O enredo é o mesmo conto de fadas padrão: A mesma jovem inexperiente e com pouco traquejo social (Lily James) se apaixona pelo viúvo rico e bom partido (Armie Hammer), indo morar na mansão dele e lidando com o fantasma da memória da sua ex-esposa, a falecida Rebecca, tendo que lidar ainda com a pressão da governanta da casa, Mrs Danvers (Kristin Scott Thomas), que a considera vulgar e inadequada para “ocupar” o lugar outrora pertencido por Rebecca, uma mulher considerada por todos como sinônimo de perfeição.
Existe a principal dúvida se a Rebecca, de fato, está assombrando a nova esposa de seu marido ou se realmente se trata de uma paranoia decorrente da opressão sofrida pela personagem. Infelizmente essa ideia é abandonada desde o início, levando para um suspense de tom policial, um tanto inexpressivo e até mesmo desinteressante. Há uma artificialidade na relação de Armie Hammer (“Me Chame Pelo Seu Nome“) e Lily James (“Em Ritmo de Fuga“), ambos não aparentam ter química e tão pouco conseguem convencer de que aquele romance é avassalador ao ponto de incomodar até mesmo os mortos. A fotografia ainda torna tudo artificial, plástico, apequenando em muito o potencial das paisagens externas, quanto da magnitude interna da mansão. Weathley consegue aproveitar o espaço da mansão, mas ao tentar tornar esse cenário personagem chave, falha em criar e aprofundar conflitos da personagem, findados em uma frustração passageira. O maniqueísmo impregnado na personagem de Kristin Scott Thomas apequena não só sua performance – magnética, nota-se – como torna o desenvolvimento da mesma em tolo.
Infelizmente, o grande potencial retido no livro acaba sendo perdido por um longa que não sabe aonde quer chegar. Se houve ambições, elas estavam contidas apenas na intenção de trazer uma nova roupagem para o homônimo livro. “Rebecca – Uma Mulher Inesquecível”, ironicamente, acaba sendo superficial e esquecível. Se alguém espera uma adaptação ou, ao menos, algo que beba dessa fonte criada por Du Maurier, recomendo assistir “Trama Fantasma“, de Paul Thomas Anderson, atualmente também disponível na Netflix – verdadeiramente inesquecível. Aqui, fica só na promessa.