Pelo quarto ano consecutivo tenho a oportunidade de cobrir o Olhar de Cinema, o festival de Curitiba, que chega nesse ano ao seu sexto ano. Cada vez mais se consolidando na cena cinematográfica local e nacional. O jovem festival sempre teve como foco apresentar filmes pouco abrangentes nos circuitos, inclusive de outros festivais. Além de dar chance para que jovens diretores possam ganhar notoriedade com seus primeiros projetos.

Diante disso, o filme de abertura desse ano foi o venezuelano La Familia, de Gustavo Rondon, presente na semana da crítica do Festival de Cannes deste ano – ao qual foi presidido pelo cineasta pernambucano Kleber Mendonça Filho.

A América latina em geral passa por um momento conturbado socialmente e politicamente, com ascensão de governos de direita, crises econômicas e por consequência colapso social. A Venezuela é um dos países em estado crítico, diante ao governo cada vez mais insustentável. O longa-metragem de Rondon tem como ótica retratar essa Venezuela em ebulição, retratando contrastes sociais aos quais não nós é comum conhecermos hoje em dia.

Particularmente, eu não imaginava na ideia de haver uma elite venezuelana se alienando em seu mundo particular, regado a champanhet e luxo em meio a multiplicação da pobreza e violência local. Rondon retrata esse vácuo social e expõe uma constatação lamentável de um vazio na sociedade daquele país: não há norte para qual seguir, a não ser o desejo da sobrevivência.

Na estória, acompanhamos um menino que mora numa região periférica, convivendo diariamente com a marginalidade. Seu pai é um “faz-tudo”, literalmente. Em dado momento, uma situação crítica ocorre e força pai e filho a fugirem daquela região por sofrerem risco de vida, pois os chefões que dominam a favela desejam puni-los. Eles então entram na odisseia em prol da sobrevivência.

A todo momento ao longo da projeção temos a impressão de que fato já vimos esse filme inúmeras vezes no decorrer do cinema latino-americano. Inclusive, a estética do longa é similar ao Cidade de Deus do brasileiro Fernando Meirelles, pra citar só um exemplo palpável. Contudo, isso não chega a ser o principal problema do filme, mais sim um discurso levemente moralista em meio à reflexão social ao quão propõe.

Embora a direção de Rondon seja bastante inspirada, precisa ao explorar aquela relação de pai e filho de forma totalmente original, carece de um argumento mais inspirado. O discurso soa importante, conversa muito com os países latino-americanos no geral, contudo é ao mesmo tempo batido, acabando por não apresentar um adendo original que agregue na narrativa da reflexão social de nosso continente.

Na apresentação do filme de abertura do 6º Olhar de Cinema, um dos diretores do festival, o também cineasta Aly Muritiba, chegou a falar que o festival sempre se propôs ter como primeiro filme obras que refletem o passado em perspectiva para o futuro e pela primeira vez optaram por um projeto que pensa no presente para refletirmos sobre o futuro no qual queremos. De fato, é um pensamento primordial, mediante a toda essa situação política crítica. Ainda não sendo uma experiência intencionalmente única, não deixa de ser relevante e necessária, sobretudo num festival locado num dos polos mais conservadores do país.

O Olhar de Cinema chegou ao seu sexto ano sem –ainda – o habitual frio da cidade, entretanto na promessa de muito calor e emoções nas salas de cinema. Se na noite de abertura não fomos surpreendidos, vamos aguardar os próximos momentos, que prometem fazer jus ao festival.

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