“Licorice Pizza” (2021); Direção: Paul Thomas Anderson; Roteiro: Paul Thomas Anderson; Elenco: Alana Haim, Cooper Hoffman, Mary Elizabeth Ellis, Sean Penn, Tom Waits, Bradley Cooper, Benny Safdie; Duração: 133 minutos; Gênero: Comédia, Romance; Produção: Sara Murphy, Adam Somner, Paul Thomas Anderson; País: Estados Unidos; Distribuição: Universal Pictures; Estreia no Brasil: 16 de Fevereiro de 2022;
A filmografia de Paul Thomas Anderson é, sem sombra de duvidas, uma das mais fascinantes dos grandes autores do cinema norte-americano. E de fato PTA (como é chamado por muitos) é um dos grandes. A maneira como seu cinema se desenvolve e flui por diversos gêneros e temas e se mantém cada vez mais original, e se reinventa também a cada obra, assim o credencia. Não que sempre uma obra seja melhor que a outra, mas cada universo que PTA constrói parece ecoar de maneira singular tanto em seu cinema como no cinema em geral. É sempre encantador descobrir o próximo passo da carreira do cineasta. E encantador é uma das melhores palavras para descrever seu novo filme, “Licorice Pizza”. Uma experiência gostosa, cuja tempo parece passar de maneira graciosa, enquanto encontramos -ou temos a sensação de encontrar- uma mistura inusitada de alguns filmes do diretor: “Boogie Nights – Prazer Sem Limites”, “Embriagado de Amor” e “Vício Inerente”. Não é só a temática, seja ela a metalinguagem com a indústria ou o romance ingênuo do protagonista, nem só também a estética, há algo aqui que transcende e conecta esses filmes, por isso o último dos três que citei vem à tona em alguns momentos do longa.
O fluxo com o qual Paul Thomas Anderson filma “Licorice Pizza” é algo fenomenal, onde as sequências vão se dando com tanta naturalidade que apenas nos deixamos levar pelos dois protagonistas e essa jornada em que os dois se encontram. Porém, o objetivo meio abstrato é condizente justamente com essa busca por alguma resposta, uma busca por propósito correspondente a jovialidade dos protagonistas e da maioria dos personagens que os rodeiam, e que tomam as rédeas do filme. Característica essa que o filme também parece tomar esteticamente para si. O resultado é algo que soa revitalizador, que nos faz reencontrar alguma paixão! E isso porque Paul Thomas Anderson faz do seu filme também uma grande carta de amor, e amor é o que há de sobra em suas intenções e em sua execução, em seus personagens e no que eles significam e na cidade que os rodeia. Esse amor é canalizado em uma nostalgia que soa mais como uma memória afetiva acolhedora. É puro carinho e sensibilidade, mostrando o quão pessoal é para PTA, mas simultâneo a essa percepção há também a percepção de algo universal, empático e relacionável. Porque é orgânico e por causa de seus personagens, especialmente os protagonistas.
Cooper Hoffman, filho do falecido Philip Seymour Hoffman, interpreta seu Gary Valentine como se já estivesse em seu décimo primeiro filme na carreira. Contudo, faz aqui sua estreia como ator e impressiona sua segurança em cena, sua capacidade em dar ao personagem o tom necessário sempre que precisa, tornando-o numa figura que certamente se juntará aos personagens memoráveis da filmografia de PTA. O garoto de apenas 19 anos brilha em cena e com certeza age em sinestesia ao diretor, que aqui presta também uma homenagem ao seu amigo e falecido pai do jovem ator. Agora, a grande estrela de “Licorice Pizza” é Alan Haim. A caçula das irmãs Haim, cuja família toda interpreta a família da personagem no filme, assume o protagonismo aqui de maneira arrebatadora. É verdade que Alana já estrelou diversos clipes com suas irmãs e a banda delas, muitos deles (muitos mesmo) dirigidos pelo próprio PTA, mas é aqui que se concretiza, de fato, sua estreia como atriz. E o nível com o qual ela se apresenta aqui… me questiono se seria capaz com outro diretor que não Paul Thomas Anderson, pois acredito que ele transmitiu a Alana a segurança necessária para extrair dela o potencial todo que vemos posto em prática quando em cena.
Será difícil esquecer Alana e Gary, tanto por seus interpretes como pelo filme que protagonizam. Uma sensação que não consigo deixar de lado é a de como o mais recente álbum das irmãs Haim, “Woman in Music Pt. III”, soa como um casamento perfeito com “Licorice Pizza”. Os sentimentos envoltos em ambos são tão similares, um sentimento típico de fim de tardes lúdicas de verões a que nos permitimos viver vez ou outra ao máximo. E Paul Thomas Anderson traduz tudo isso através do seu cinema, mais uma vez. É lindo! É estiloso! Desde a recriação de um cenário que ilustrava a vida dos personagens reais que encontramos aqui, à forma como PTA captura esses momentos, inclusive literalmente, pois também co-assina o filme como diretor de fotografia. O resultado é uma visão ganhando vida em sua plenitude, e “Licorice Pizza” exala vida. Viva! E cada momento parece especial, porque a montagem constituí todos esses momentos, elementos e personagens, como são. E pedaço a pedaço, passo a passo, Paul Thomas Anderson, sua equipe e seus atores constroem outro grande filme na carreira do diretor, um que aquece o coração e nos preenche de sensibilidade. E mais do que acreditar no amor, nos faz acreditar em amar.