Laureado com uma mini retrospectiva na 40ª Mostra de São Paulo, o diretor Jim Jarmusch teve seu último longa Paterson exibido pela primeira vez nacionalmente. Saído direto do Festival de Cannes desse ano, o longa rendeu elogios, apesar de não terem se convertido num prêmio concreto no júri do festival francês. Posso dizer com clareza: trata-se de uma experiência difícil, difícil de se embarcar e plenamente compreender, o que nesse caso pode gerar incompreensão.

Entretanto, aos que vão com bom grado, mente aberta e paciência irão se deparar com um filme extremamente sensível, plenamente melancólico e vastamente analítico na construção da sua narrativa. O longa narra o cotidiano de Paterson (Adam Driver), um motorista de ônibus na cidade de mesmo nome. Todo dia ele tem a mesma rotina: Acorda, vai trabalhar, retorna para casa, janta com a esposa (Golshifteh Farahani) sai para passear com seu cachorro buldogue inglês, vai num bar local, por fim recomeça o dia. E essa rotina diária se repete todos os dias, com pouquíssimas alterações, sendo exatamente isso o exibido ao longo dos quase 120 minutos de projeção.

Reitero a dificuldade de se embarcar num filme desses que usa a repetição como recurso narrativo metalinguístico, o anseio da construção de uma poesia visual torna aquele cotidiano banal uma eterna página em branco num caderno, no qual Paterson, aspirante a poeta, precisa escrever. Entretanto, Paterson não problematiza e nem confronta sua banalidade, ele simplesmente aceita a tudo que lhe acontece, sem questionamentos ou ponderações. Quem serve de juiz é o público que em dado momento não aguenta ver tanta passividade e tolerância (!) vindo de um personagem refém de um cotidiano tão infeliz – na nossa visão.

Jim Jarmusch então provoca a todo momento o espectador, ele anseia termos uma reação ao contrário de seu personagem. Ouso dizer: Sua direção beira ao próprio banal da narrativa de seus personagens, de forma soberba na forma de contar uma estória fútil de forma recheada. O maior questionamento dado é se o cotidiano de Paterson era mesmo tão infeliz assim, ainda que ele não se sinta incompleto ou se o nosso próprio cotidiano é vazio ao ponto de sermos confrontados com um padronizado.

Paterson segue uma argumentação niilista presente nas obras do diretor, entretanto ele subvertem o niilismo ao seu favor. Passa mais a ser uma qualidade do ponto de vista narrativo a completa apatia do personagem do que um defeito – quem problematiza somos nós. A sutileza da narrativa encanta e emociona pela fácil identificação aos poucos, doa a quem doer, todos nós temos um pouco de Paterson e até gostamos de uma agradável e confortável rotina. Justamente por isso o longa-metragem cresce tanto no pós-exibição, pois carregamos ele como um fardo a ser digerido, lembrado, sentido.  Tornando Paterson um longa uma singela experiência.

TRAILER LEGENDADO

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