O diretor dinamarquês estreia sua carreira internacional após ganhar notoriedade de crítica com o aclamado “Oslo, 31 de Agosto”, longa no qual dissertava sobre a depressão sufocante de seu protagonista. Agora em “Mais Fortes que Bombas”, Trier retorna a temática contudo acrescentando novos parâmetros ao assunto, mostrando novos prismas da depressão em si, não meramente como uma doença adquirida, sim algo construído decorrente de fatores sociais e individuais. Desde a cena inicial quando vemos Jonah (Jesse Eisenberg) numa maternidade, sua mulher recém pariu seu filho e ele encontra-se em estado de entorpecimento. Por coincidência encontra uma ex-namorada no mesmo hospital, algo banal, contudo que vai refletindo o arrependimento do personagem em ter optado por certas escolhas que o levaram até aquela ocasião. Complexo? Sim, entretanto o longa-metragem é tudo menos didático, pois envolve questões essenciais do homem, sua humanidade é posta em perspectiva.

Tanto Jonah quanto o resto de sua família enfrentam a dor do luto ocasionado pela morte prematura de sua mãe Isabelle (Isabelle Huppert), o que gerou maiores problemas familiares. Dois anos após isso, uma galeria decide render um tributo para a finada que era uma notória fotógrafa de guerra, com isso os dilemas do acontecimento afetam ainda mais o patriarca Gene (Gabriel Byrne) , tentando recomeçar sua vida amorosa e lidar com o seu filho mais novo e rebelde Conrad (Devid Druid). É um longa que se baseia no luto para destrinchar questões mais complexas, esbalda humanidade, ainda que o diretor opte por um olhar clínico da depressão, há a sensibilidade grande em percebermos questões que englobam os personagens: Isabelle, portadora de depressão, usava seu trabalho como fuga da realidade, ela simplesmente se sentia deslocada dentro de sua casa, não à altura do papel de mãe e esposa. Não por acaso a narrativa gira entorno de sua personagem e sobrepõe suas fotos como narrativa, sobretudo por ela tentar fotografar algo em si no qual não conseguia enxergar, qual na verdade era a sua obrigação para com a família? E, principalmente, o que eles esperam dela e ela espera deles?  Já Gene representa o marido pródigo que abriu mão de seus sonhos em detrimento da construção de uma família, porém o que ele percebe hoje é ter algo completamente fragmentado e superficial, não conseguindo se comunicar com seu filho mais novo, que sofre com o amadurecer e a ausência da figura materna. Contudo, o mais doloroso do roteiro é quando percebemos que, afinal, o que é mais forte que bombas é a percepção que vivemos uma mentira há tanto tempo, que os problemas familiares de Gene eram anteriores ao falecimento de sua esposa, tendo inclusive influenciado sua cadência para a depressão. Por fim, temos Jonah que busca fugir da mesma falha de seus pais, abrir mão demais sem saber se é isso mesmo que deseja, são personagens que de alguma forma tem algum tipo de depressão ou tendência para, mas que tentam compreender o motivo de estar naquele estado e uma justificativa que tenha culminado ao fim trágico de sua mãe -em dado momento nos deparamos com a confirmação de suicídio.

A obra consegue apresentar uma estética que ultrapassa os limites narrativos, entra nos méritos psicológicos e filosóficos, usa diferentes linguagens para mostrar as diferentes fases de seus personagens, pode ter um ritmo cansativo por seu tom sério e sem recuos, o que não me soa um defeito, porém deve cansar o público médio. O elenco é soberbo, Huppert demonstra ser uma das musas do cinema internacional, conseguindo se expressar com um olhar, Gabriel Byrne outra joia como ator, merece papéis como este para ser aproveitado. Jesse Eisenberg consegue mostrar também como é um expressivo e empático ator, esqueçam a bobagem que ele fez ao aceitar ser o Lex Luthor em Batman Vs Superman. A revelação fica por conta do novato Devid Druid que é ótimo, além de apresentar certa semelhança com Isabelle Huppert, consegue ter o mesmo efeito do olhar devastador, algo para poucos. Olho vivo, portanto, em Joachim Trier, um realizador com capacidade em dissertar sobre depressão com consistência, humanidade e muita potência narrativa. Tanto esse filme como seu anterior são obras que ficam ecoando no espectador por um bom tempo, até nos depararmos com seu real significado. É bárbaro, ainda que doloroso.

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